O livro da coleção “Os Pensadores”, o volume I, que estuda a doxografia e fragmentos dos Pré-Socráticos, traz em evidência Anaximandro de Mileto (610-547 a.C), este no estudo da história da filosofia é reconhecido como discípulo de Tales de Mileto e juntamente a Anaxímenes compõe a escola Jônica. O filósofo é responsável pela definição monista do Ápeiron que significa indefinido ou infinito[1]. Essa definição se inaugura em Mileto, na Grécia Antiga no século V a.C. Seu destaque se dá, por considerá-lo como um dos primeiros filósofos naturalistas na época do surgimento do pensamento filosófico do ocidente. Sua comunicação chega aos dias de hoje por pequenos fragmentos e trechos de comentadores subsequentes como Aristóteles, Simplício e Hipólito que utilizam o pensamento por eles conhecido do discípulo de Tales para abordar seus desenvolvimentos filosóficos nas áreas como metafisica, meteorologia e física.[2]
É salutar questionar o motivo pelo qual o Ápeiron é aproveitado pelos pensadores antigos e reverberado em muitas outras correntes de estudos, conceitos e ciências posteriores. A natureza do Ápeiron, que significa “indefinido”, é encarado na perspectiva geracional de todas as coisas, ou seja, um princípio, logo ele deve ser eterno e imperecível e diferente elementarmente das coisas perecíveis. Todas as coisas, portanto, existem não pela mudança de elemento, como afirma seu antecessor, mas da separação dos contrários oriundos do eterno movimento.
O filósofo Jônico desenvolve teorias no campo da geografia e da astronomia ao tratar das dimensões do mundo. Em escritos de Simplício é constatado sua colocação sobre a Terra como eixo cilíndrico, erguido por outro eixo de fogo e cada porção terrestre estava contida nos extremos do todo. Para ele, o sol era uma esfera de fogo através de um buraco e se envolvia nas extremidades do cilindro. No livro da Meteorologia de Aristóteles, o estagirita liga a Anaximandro a ideia dos compostos terrestres ao analisar a observação da umidade e os fenômenos decorrentes desta, como por exemplo o vento e as órbitas do sol e da lua originários da evaporação da umidade e para isso se considera o mar o resíduo da primeira aquosidade.[3]
Outro comentário bastante relevante provém da crítica moderna exemplificado no livro feito por Friedrich Nietzsche. Este categoriza a filosofia grega em seus pensamentos pragmáticos sobre o homem, estes comentários estão no livro “A filosofia na Época Trágica dos Gregos” escrito no período de 1873 a 1874, o filosofo alemão se vê fascinado pela maneira em que os gregos coligam os seus pensamentos a também uma maneira de ser. No inciso quarto do livro, Nietzsche discorre sobre o pensador jônico como escritor filosófico antigo por excelência e grande sucessor de Tales de Mileto, ele elogia sua originalidade por não se subtrair a estímulos alheios, como os filósofos modernos, e mesmo na simplicidade dos escritos ele expressa a “sabedoria altíssima”[4].
O ponto central do comentário Nietzschiano é o vir-a-ser que pode ser contemplado na teoria de Anaximandro no quesito da separação dos contrários e o pensador contemporâneo aplica ao homem esses conceitos em razão da análise de que o ser humano é um ser sempre passível de perecimento e as razões pelo qual ele é dessa maneira. No transcorrer do texto o alemão tece detalhes mais razoáveis da natureza do Ápeiron em relação a perspicácia de Anaximandro a observar que seres com propriedades determinadas, isto é, que já vieram a ser, jamais poderão ser origem e princípio, pois se já vieram, já nasceram e por lógica natural terão um fim.[5]
O pensamento de Anaximandro do Ápeiron influencia não apenas os seus discípulos como Anaxímenes, mas gera na posteridade levar em conta existir algo sem definição, ilimitado, infinito ou eterno que impulsiona, que dá origem e movimento as coisas. Na filosofia antiga a afirmação de Anaximandro transmite em muitos outros pensadores gregos, envoltos no caráter monista, a sua defluência tal como Anaxímenes em relação ao Ar Infinito, o devir de Heráclito, a doutrina dos contrários de Empédocles e Anaxágoras e o pós socrático motor imóvel de Aristóteles.
Na história da filosofia se vê respingos das reflexões do Milanês por exemplo nas concepções metafísicas e racionais que partem de algo pré-existente de todas coisas. Em outras ciências se concebe também a interpretação do Ápeiron como na Astronomia, nas teorias do universo infinito, nas dimensões da Terra, na Teologia no âmbito da existência e problemática de Deus, nas buscas químicas dos funcionamentos e origens dos átomos e nas investigações dos fenômenos físicos.
É de grande importância o estudo sobre Anaximandro de Mileto, um homem grego que, mesmo nos limitados recursos, foi capaz de instaurar pensamentos, pesquisas e observações que até os dias atuais são aproveitados para novas análises e questões. Vale ressaltar, por fim, citar a valia de toda a escola jônica que é o destrave das mais variadas problemáticas sobre o homem e a natureza. O que seria do mundo, afinal, sem as perguntas?
Agora, que tal adentrar no universo dos problemas da filosofia antiga? Quais as tantas outras contribuições de outros filósofos para a atualidade? Se lhe cativou este texto, se aprofunde e compartilhe este conteúdo!
[1] ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. Tradução de Alfredo Bosi. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
[2] Os Pré-Socráticos: Fragmentos, Doxografia e Comentários. Tradução de José Cavalcante de Souza et al. 4. Ed. São Paulo: Nova Cultural, 1989; v.1. Coleção Os Pensadores.
[3] PORFÍRIO, Francisco. Anaximandro; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/filosofia/anaximandro.htm. Acesso em 19 de março de 2023.
[4] NIETZSCHE, Friedrich. Obras incompletas: A filosofia na época trágica dos gregos. 2. Ed. São Paulo: Nova Cultural, 1987.
[5] Op cit, § 4
Autor: Pedro Igor Farias Rodrigues, estudante do 2º ano do Curso de Filosofia da FASBAM.
Eu tinha a coleção “Os Pensadores”, muito boa.
Muito profunda as coisas faladas neste texto.
É incrível como estes gênios filósofos conseguiram evoluir o pensamento humano.
Muito interessante perceber a intextualidade entre os saberes de pensadores “leigos” e os princípios do conhecimento adquirido nos idos da existência humana.
Assim, dá-se credibilidade à velha máxima que assevera que nada se cria mas que tudo se copia. Fato.