Novo número de Basilíade – Revista de Filosofia trata sobre as Expressões Filosóficas da Linguagem na Antiguidade

A FASBAM tem a grata satisfação de apresentar o vol. 5, Nº 9, de Basilíade – Revista de Filosofia, correspondente ao período de janeiro-junho de 2023 e cujo dossiê se intitula: As Expressões Filosóficas da Linguagem na Antiguidade (clique aqui).

Efetivamente, esta é uma problemática que atravessa e marca a história da filosofia desde os seus primórdios até os dias de hoje. De Platão a Derrida, de Parmênides a Lacan, é recorrente o pressuposto segundo o qual não se pode separar o dizer de um autor de sua ética, de sua antropologia, de sua epistemologia e de sua visão de mundo. É que a dinâmica da escrita, ou do texto, se desdobra através de um contínuo reinterpretar, revalorar e, portanto, recriar. Pela palavra texto, nós entendemos aquilo que Lacan designa pelos termos de letra ou de real, os quais apontam incessantemente para uma resistência, um obstáculo e, simultaneamente, uma passagem, um caminho, uma porta ou um meio pelo qual o desejo não cessa de se desenrolar, de se simbolizar, de se repetir e de se diferenciar, mas na diferença e no querer mais. É próprio, portanto, da linguagem retomar as significações que já foram expressas, faladas e pensadas para revesti-las de um novo dizer que encera e, ao mesmo tempo, descerra uma infinidade de potencialidades ou, para exprimirmo-nos kierkegaardianamente, de possibilidades até então veladas, ou ainda não completamente percebidas, desveladas.

Deste modo, apresentando-se como um constante processo de construção e destruição, o texto paradoxalmente suscita uma pluralidade de significações, cuja tessitura determina a evolução e as transformações peculiares a todo pensar. Esta é a razão pela qual a escrita e, portanto, a linguagem exerce literalmente a função de ponte, de porta ou de passagem por onde se engendra uma multiplicidade de leituras, de visões e intuições insuspeitas. Daí também a necessidade de se perguntar em que escrito, ou em que período de sua evolução, um determinado autor – seja ele Platão, Aristóteles, Sêneca, Santo Agostinho ou qualquer outro pensador – elaborou, ou reelaborou, uma nova ideia ou um novo conceito. É que um conceito, um significante, uma ideia, uma imagem ou uma figura jamais se encontram isolados, mas, antes, conectados uns aos outros, incluídos uns nos outros, na medida em que os significantes só significam aquilo para o qual eles apontam, ou reenviam. Neste sentido, é lícito afirmar – conquanto de maneira hiperbólica – que a filosofia é uma contínua repetição, uma incessante superação ou, mais exatamente, uma interminável ressignificação e recriação…

A partir destas reflexões, e levando-se em consideração as diferentes vicissitudes pelas quais passou a linguagem do pensamento na antiguidade e em outras épocas da história da filosofia, nós apresentamos os textos dos autores que contribuíram para a realização deste número de Basilíade – Revista de Filosofia. Assim:

O primeiro artigo, de autoria de Matheus Jeske Vahl, tem como título: Estado e religião em Santo Agostinho: Uma reflexão a partir da querela donatista. Segundo Jeske Vahl, o pensamento político de Santo Agostinho não está sistematizado em um conjunto teórico de obras. Ele é, antes, fruto de sua reflexão sobre problemas concretos como a legitimidade de intervenção estatal em querelas religiosas. Para Agostinho – sustenta o autor – uma das razões para a decadência social de Roma é sua crença em falsas narrativas que não levaram os cidadãos a um crescimento moral autêntico. Ademais, esclarece Jeske Vahl, a tônica do empreendimento agostiniano está concentrada no encadeamento racional de argumentos sofisticadamente elaborados em uma forte expressão retórica de convencimento de seus interlocutores. Esta é a razão pela qual ele logo se tornou uma das figuras públicas mais emblemáticas da África, na medida em que assumiu a missão de pacificar um conflito que acabou por transcender rapidamente os limites do discurso.

O segundo artigo, intitulado Sêneca, Freud e a consciência moral, é de autoria de Rogério Miranda de Almeida. O seu objetivo principal é o de mostrar a surpreendente coincidência de intuições e, de certo modo, de linguagem que se verifica entre Sêneca e Freud no que diz respeito ao conceito de consciência moral e, mais precisamente, à questão do sentimento de culpa. Efetivamente, tanto o estoico romano quanto o inventor da psicanálise sondaram, exploraram e expressaram com uma linguagem e uma acuidade insuperáveis a dinâmica que se desenrola no interior do sujeito no que diz respeito à representação das chamadas más ações. Para ambos os pensadores, toda diferença se anula entre, de um lado, o desejo de cometer uma má ação e, de outro, o pôr em prática a mesma ação desejada. Isto significa que a intenção e o ato se equivalem, pois o sujeito já desejou executá-lo. Ademais, o sentimento de culpa se apresenta como a instância da censura ou da reprovação, que Freud designará pela expressão: interiorização da autoridade.

Os autores do terceiro artigo são Jefferson da Silva e Marcius Tadeu Maciel Nahur. O texto em questão se intitula: O problema gnosiológico da representação: Impactos metafísicos, antropológicos e científicos. Este artigo investiga as bases filosóficas primárias do aspecto gnosiológico da representação, enquanto modelo cognoscitivo da realidade, vislumbrando assim uma ruptura entre a representação e o ser ao longo de um complexo movimento de transformação nos fundamentos da vida espiritual e intelectual da civilização ocidental. Esta transformação se efetuou sobre a concepção nominalista das coordenadas do universo mental do homem antigo-medieval. Podem-se, pois, reconhecer os efeitos mais notáveis da teoria moderna da representação a partir da supressão, na sua tecitura, da clássica distinção aristotélica entre três grandes formas de conhecimento: o teorético, o prático e o poiético. Nessa nova primazia, o modelo poiético se apresenta como uma base suficiente do conhecimento, pois é nesse modelo que o próprio homem experimenta, por um lado, uma contradição vivida entre seu ser finito e situado, e, por outro, a pretensão de ser uma espécie de fabricador absoluto do sentido.

O quarto artigo, da autoria de Antônio Adriano de Meneses Bittencourt e Eduardo Ferreira Chagas, tem como título: Considerações sobre a religião segundo a ecosofia. Segundo os autores, o termo ecosofia evoca a necessidade de se pensar uma nova relação entre o homem e o meio ambiente a partir de um paradigma pós-cartesiano, uma vez que, sob a égide do cartesianismo, subscreveu-se uma forma de dominação sobre a natureza, que se apresenta como “serva” do homem. Ainda conforme os autores, a ecosofia abrange uma dimensão metafísica que está além das formas consensuais de combate ao desequilíbrio ambiental, pois ela pressupõe o reconhecimento da interdependência dos seres vivos entre si, em relação ao meio ambiente e à natureza, tomada como origem comum de todos. Esta última questão remonta à antiguidade, na medida em que ela exprime um conflito com a tradição espiritual judaico-cristã do Ocidente.

O quinto artigo, Fé e razão na Introdução ao cristianismo de J. Ratzinger, é da autoria de Evanildo Costeski. Neste estudo, o autor busca compreender a categoria de fé tal como a desenvolveu Ratzinger na sua Introdução ao cristianismo. Estão incluídos nessa categoria as ideias de “salto de fé” e do “Deus da fé e Deus dos Filósofos”. No final do artigo, o autor centra as suas análises sobre o conceito de amor que, segundo ele, se apresenta como uma síntese do pensamento de Ratzinger.

O autor do sexto e último artigo é Alessandro Cavassin Alves e o seu texto, de caráter mais histórico e sociológico, se intitula História e teoria social em José Honório Rodrigues. Segundo o autor, o presente estudo busca apresentar um conceito importante da teoria social honoriana, que é a “conciliação” e as consequências de um comportamento advindo dos grupos oligárquicos brasileiros. O estudo salienta igualmente a importância que o historiador assinala ao povo brasileiro no processo de construção desse país através de uma dialética de enfrentamento das injustiças sociais históricas. Para levar a cabo a sua tarefa, o autor desenvolve uma análise de duas obras de José Honório Rodrigues: Aspirações nacionais, de 1963, republicada em 1970, e Conciliação e reforma no Brasil, de 1965.

Encimam o presente dossiê duas recensões. A primeira, de autoria de Júlia Cabral Rinaldi, versa sobre a obra: ALMEIDA, Rogério Miranda de. História da filosofia moderna. Curitiba: FASBAMPRESS, 2021. Quanto à segunda recensão, de autoria de Renata de Souza Pires, ela apresenta uma análise da obra: CORDEIRO, Jaime. Escrevendo sobre universidade, campo educacional e história da educação. Curitiba: Brazil Publishing, 2020.

O nosso caloroso agradecimento aos autores e às autoras que contribuíram para este número de Basilíade e os nossos votos de uma profícua leitura a todos aqueles que aspiram ao conhecimento e à difusão da cultura.

 

Os Editores:

Irineu Letenski,

Rogério Miranda de Almeida.

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