História da Filosofia Moderna é o novo livro do Prof. Dr. Rogério Miranda de Almeida publicado por FASBAMPRESS

O título da presente obra, História da filosofia moderna, por já se achar consagrado em centenas de outras obras que se dedicaram a explorar a história de um dos períodos que marcaram a filosofia ocidental, parece, à primeira vista, não apresentar nenhum problema nem suscitar alguma surpresa. Todavia, nem o conceito de “modernidade” nem o adjetivo “moderno”, de onde ele provém, têm uma significação unívoca e, por isto mesmo, eles têm recebido as mais diversas e até opostas interpretações. O adjetivo “moderno”, que deriva do latim tardio modernus e se liga ao advérbio modo (há pouco, recentemente, agora), remonta até ao século VI. Em francês, a sua presença já era atestada no século XIV. A partir do século X, modernus foi habitualmente empregado nas discussões filosóficas e nas polêmicas religiosas para exprimir, quase sempre de maneira subentendida, duas acepções básicas: 1) positivamente, este termo significava um encômio que se fazia a todos aqueles que revelavam uma abertura e uma liberdade de espírito, uma familiaridade com os mais recentes eventos e com as novas ideias que estavam em voga; 2) negativamente, o adjetivo “moderno” manifestava sempre uma crítica: crítica à leviandade e à superficialidade nas discussões, crítica à preocupação pela moda e pelo amor irrefletido às mudanças, assim como à tendência a se deixar entusiasmar pelas descobertas do momento negligenciando, porém, o conhecimento do passado.

Do ponto de vista filosófico, durante os séculos XIV e XV se assistiu ao nascimento de duas correntes que, de certo modo, prolongaram e reacenderam os debates que, nos séculos anteriores, giravam em torno dos “universais”. De um lado, havia a chamada via antiqua, representada pelos adeptos de Tomás de Aquino, de Duns Scoto e de outros pensadores que, ao se apresentarem como os fiéis paladinos da tradição do século XIII e ao sustentarem a existência dos universais nas realidades singulares, eram, por isso mesmo, denominados “antiqui” ou “reales”. De outro lado, havia a corrente dos que defendiam a via moderna, que não deve ser confundida com a filosofia de Ockham nem tampouco com a de seus seguidores. Esta tendência, representada pelos chamados “moderni” ou “nominales”, não somente se difundiu rapidamente, mas também alcançou uma sólida posição na universidade de Paris e em outras universidades europeias. 

Do ponto de vista historiográfico, convencionou-se designar pela expressão “Idade Moderna” aquele período que se iniciou com a tomada de Constantinopla, em 1453, ou com a chamada descoberta do Novo Mundo, em 1492. Esta nova idade se estende até ao final do século XVIII e, mais precisamente, até a Revolução Francesa (1789), quando começou a Idade Contemporânea. Convém também ressaltar que foi somente a partir do século XVII que se impôs a propensão a se dividir a história ocidental em três períodos principais: antigo, medieval e moderno. Com efeito, esta divisão tripartite aparece pela primeira vez, e de maneira explícita, na história que Christoph Keller escreveu entre 1685 e 1696, da qual um dos compêndios se intitulava, justamente, Historia Medii Aevi.

Filosoficamente considerada, e dependendo da leitura e dos pressupostos com os quais se analisa este conceito, a modernidade se teria iniciado já na Idade Média Tardia, ou no Renascimento, ou ainda – de acordo com uma concepção que já se consolidou a partir de Hegel – com a filosofia de Descartes e Hobbes. Se se assume, pois, este último ponto de vista, a filosofia moderna é essencialmente marcada pela ilustração que, ao permear e pontilhar o pensamento do século XVII, atingiu o seu florescimento máximo na segunda metade do século XVIII. Consequentemente, se é lícito escolher mais nomes, poder-se-ia afirmar que a filosofia moderna começou com Bacon, Hobbes, Locke, Descartes, e terminou com Immanuel Kant. É, pois, esta divisão que norteia, estrutura e anima a presente obra.

Convém, no entanto, notar que o principal ponto de discórdia não consiste tanto na periodização da história em geral que, por ela mesma, já levanta a questão de saber o que, em última instância, determina o fim de um período e o começo de outro. O problema crucial reside, antes, na acepção que se costuma assinalar ao conceito de “modernidade”. Certo, conforme eu já avancei mais acima, os historiadores da filosofia consideram, na sua quase unanimidade, que a modernidade se teria iniciado no século XVII, com Descartes e Hobbes, e se teria consumado no final do século XVIII, com Immanuel Kant. Outros, porém, veem a modernidade como um processo que ainda não se completou. É o que sustentam, por exemplo, Alain Badiou, Christian Jambet, Guy Lardreau e, numa visão manifestamente conservadora, Jürgen Habermas, para quem a modernidade se apresenta como um “projeto inacabado”. A partir de perspectivas e horizontes diferentes, se posicionam pensadores tais como Gilles Deleuze, Jean-François Lyotard, Jacques Derrida, Michel Foucault, Sarah Kofman, Gianni Vattimo, Richard Rorty, Jean-Luc Nancy e Philippe Lacoue-Labarthe. Para estes filósofos, a nossa época é marcada pelo signo da subjetividade e eles consideram de modo geral – a despeito das nuanças e diferenças que caracterizam os seus respectivos pensamentos – que esta época está marchando para a sua realização final. É o que se convencionou designar – a partir da inspiração e interpretação de suas filosofias – pela expressão: “fim da modernidade”. A este “fim” se ajuntaram outros “fins”, tais como: o “fim da metafísica”, o “fim da religião”, o “fim do logocentrismo”, o “fim da racionalidade”, o “fim do sujeito” etc. Heidegger especificamente interpretou o pensamento de Nietzsche como representando o remate, a completude, ou o fim da metafísica.

A questão, porém, que importa elucidar é a de saber se realmente estamos vivendo um período moderno da filosofia e, caso isto seja verdade, seria este período efetivamente caracterizado pela noção de subjetividade? Para perguntá-lo de outro modo: em que medida se poderia afirmar que ainda somos galileanos, cartesianos e kantianos? O que permite dizer que os conceitos de razão e sujeito constituem os dois vetores que norteiam a marcha do pensamento contemporâneo? Seria verdade que a subjetividade – marcada pela racionalidade com a qual Descartes e Kant a dotaram – se sobreleva como o último avatar da metafísica?

O certo, porém, é que ao termo “modernidade” se apensaram, além dos conceitos de sujeito e razão, as mais variadas noções, ideias, correntes de pensamento e movimentos culturais: ciência, técnica, progresso, crítica, emancipação, secularização, historicismo, mecanicismo, metafísica e niilismo. Note-se, contudo, que a preferência por esta ou aquela categoria que viria caracterizar a modernidade está vinculada àquela outra problemática que diz respeito às diferentes cronologias com as quais se tenta delimitar o inteiro período. Àquele, portanto, que aduzisse razões sustentando que a modernidade teria efetivamente começado, por exemplo, com as ciências físico-matemáticas da primeira metade do século XVII, poder-se-iam contrapor outras tantas razões, segundo as quais ela se teria de fato iniciado com Guilherme de Ockham (c. 1285–c. 1349). Efetivamente, ao introduzir uma nova lógica e uma nova teoria do conhecimento centrada essencialmente nas realidades singulares, individuais, Ockham é reconhecido por um número não negligenciável de estudiosos como sendo o verdadeiro prógono das ciências empíricas modernas, cujo método fundamental de investigação se baseia na análise, na experiência e na indução.

Cabe, pois, ao leitor tirar suas próprias conclusões a partir desta obra que o autor se esforçou por torná-la acessível, sucinta e, ao mesmo tempo, apta a fornecer uma visão de conjunto da história da filosofia que caracterizou os séculos XVII e XVIII. A exemplo das duas Histórias anteriores – História da filosofia antiga e História da filosofia medieval – na presente obra também eu procurei não sobrecarregar suas notas de rodapé com informações adicionais nem com um aparato bibliográfico que o leitor poderá, caso esteja interessado, descobrir por ele próprio. Esta é a razão pela qual as notas de rodapé às quais eu remeto contêm, na sua maioria, somente as referências bibliográficas indispensáveis. Tentei igualmente, como nas duas obras anteriores, apresentar as principais ideias dos filósofos aqui estudados de maneira clara, acadêmica, técnica, evitando simultaneamente resvalar para temas demasiadamente específicos ou para uma terminologia que se revelaria, afinal de contas, abstrusa e improfícua. Deste modo, esta História da filosofia moderna poderá – assim espero eu – servir de introdução e, ao mesmo tempo, de incentivo para novas pesquisas e ulteriores aprofundamentos…

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