Max Scheler e os graus da vida

O tema “homem” desde tempos longínquos inquietou muitos pensadores, que a seu turno e de acordo com o período em que viveram, pautaram seus esforços em buscar explicações e argumentos que favorecem um verdadeiro entendimento do que vem a ser o homem, o seu destino e a sua finalidade.

Explorar a noção de homem, por meio de uma reflexão antropológica que revelasse, pelo questionamento filosófico, a justificativa da real posição do homem no universo, o que lhe faz diferente dos demais seres vivos, o que lhe comporta tamanha diferenciação, tendo em vista coabitarem o mesmo espaço físico-biológico foi um dos principais intentos de Max Scheler (1874-1928) em sua produção filosófica. Assim, mesmo sendo antiga a indagação sobre o homem, a antropologia filosófica como investigação acadêmica tem a sua instauração recente, sobretudo a partir dos trabalhos do próprio Max Scheler, de modo precípuo com a obra A posição do homem no cosmos (1928), que pretendia investigar e propor uma interpretação sobre a estrutura fundamental do ser humano.

Já no prefácio de A posição do homem no cosmos, Scheler revela o acesso pessoal que teve ao tema, pois segundo ele, “O que é o ser humano? e Qual é a sua posição no ser? ocuparam-me desde o primeiro florescer de minha consciência filosófica de forma mais essencial do que todas as outras questões filosóficas.”[1]

No primeiro capítulo da obra em questão, Scheler, ao designar uma posição particular ao ser humano, especifica a questão acerca da posição do homem no mundo, subdividindo-o numa escala, como que em graus essenciais, que abrangem em primeiro lugar o ser inorgânico, em segundo os vegetais, em terceiro e quarto os animais em seus níveis diversos de desenvolvimento e por fim, já fora do alcance dessa gradação, o homem, pois fora dotado de características superiores e singulares aos demais seres, remetendo tal modelo de graus ao descrito por Aristóteles, sem demasiadas modificações.

O pensador em tela se vale de que a vida é determinada por uma gradação de forças psíquicas, incorporada numa estrutura escalonada do ser. Para tanto, o referido filósofo indica que a vida se coaduna de dupla forma, considerando primeiro, do exterior que se caracteriza pelo automovimento, autoformação, autodiferenciação e autodelimitação de um ponto de vista temporal e espacial; e segundo, considerando a partir do interior, pelo contrário, os seres vivos são determinados por um ser interno para si, no qual tomam consciência de si.[2] Deste modo, a vida possuindo uma unidade biopsíquica tem por significado que todo ser vivo, incluindo os vegetais, tem um lado psíquico, o que encerra o pensamento de Scheler em amoldar uma fenomenologia dos graus da vida como forma a delinear a natureza essencial do homem.

Ao desenvolver uma escala dos graus da vida, que denomina a “construção do mundo psíquico”, perpassa Scheler pela relação dos seres vivos de forma gradual, a iniciar com o impulso afetivo (plantas), o instinto (insetos e animais inferiores), memória associativa (animais superiores) e inteligência prática (primatas). O homem, mesmo participando de modo parcial destes graus, supera-os, ao passo de não ser constado nesta gradação. O homem possui o “espírito” que o coloca numa posição superior, que o capacita além da razão, a intuir, a ter vontade e de sentir emoções.

A conclusão que Max Scheler chega é que o homem possui uma centralidade suprema face aos demais seres viventes, dado pela presença do espírito que lhe permite, além da razão e da inteligência, alcançar o status de ser espiritual. Por meio da elaboração de uma escala da vida, baseada em graus aos moldes como fizera Aristóteles, o referido pensador elenca que, mesmo diante de toda construção do mundo psíquico – plantas, vegetais e animais – a natureza essencial do homem a supera.

Portanto, refletindo sobre A posição do homem nos cosmos, Scheler desenvolve uma valorosa fenomenologia do espírito, demonstrando suas condições peculiares e essenciais, tal qual não se detém em explicar a unidade humana somente, mas se centra em identificar o que é inerente ao homem, o seu diferencial, distinguindo-o de toda a linhagem animal, situando-o no topo da hierarquia dos seres no mundo.

 

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Por: Fr. Bruno Coelho Gonçalves, SAC, aluno do 3º de Filosofia da FASBAM (2022)

 

Referências

SCHELER, M. A posição do homem no cosmos. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2003.

[1] SCHELER, M. A posição do homem no cosmos. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2003, p. 1.

[2] SCHELER. Op. cit., p. 8.

 

1 thoughts on “Max Scheler e os graus da vida

  1. Fagner José Wilman says:

    Victor Frankl serviu-se deste pensamento de Scheler para desenvolver suas ideias acerca do ser humano. A partir destas ideias ele formulou a Logoterapia.

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