Santo Agostinho sobre a liberdade

A Filosofia, enquanto área do sobre que busca refletir sobre os diversos temas caros ao ser humano, vêm por meio da investigação do agir humano, traçar perspectivas que o auxiliem a entender e clarificar os ditames da vida como um todo. A liberdade mostra-se como um tema recorrente no estudo de inúmeros filósofos, que a seus modos e em suas épocas demonstraram por meio de seus argumentos, a noção, origem e real apreensão do que venha a ser a liberdade.

Urge como um dos principais debatedores do tema liberdade, Agostinho de Hipona (354-430), grande pensador do período antigo tardio ou do início do Idade Média, já que vivera no momento histórico de transição da Idade Antiga para a Idade Média, ao qual lhe enriquece o pensamento neoplatônico e a nascente filosofia cristã, já que é considerado um renomado nome do pensamento cristão do período do século V.

Santo Agostinho expõe o seu pensamento sobre liberdade em várias de suas obras, entre elas a Cidade de Deus e, principalmente em O livre-arbítrio. Na primeira obra podemos majorar que a liberdade é um dom de Deus dispensados a todos os seus eleitos, vez que se coaduna numa incapacidade para pecar, ao passo que nem os bem-aventurados serão privados de livre-arbítrio por não sentirem o atrativo do pecado, mas de modo inverso, será mais livre esse arbítrio desde que se veja liberto do atrativo do pecado até chegar ao atrativo indeclinável de não pecar. (AGOSTINHO, 2008, s/p.)

Já em O livre-arbítrio, a liberdade do ser humano é tomada como tema principal, bem como a origem do mal moral, onde, para Agostinho, a origem do pecado está no uso abusivo da liberdade, visto que o livre-arbítrio se constitui uma grande dádiva de Deus. Dentro desta obra em específico, o Bispo de Hipona busca fundamentar a origem e causa do pecado, bem como esclarecer a responsabilidade humana de acordo com a prática de seus atos livres. Tais esclarecimentos vêm da motivação de Agostinho em rebater o pensamento maniqueísta, haja vista estar já num estágio avançado de sua conversão, buscando neste interim, explicar a origem do mal no agir humano. O mal, segundo Aurelius Augustinus, pode ser examinado através de três níveis, a saber, do ponto de vista metafísico ontológico, do ponto de vista moral e por derradeiro, do ponto de vista físico. Interessa, na obra em tela, retratar o mal do enfoque moral, enfatizando que o mal moral é o pecado, “aversio a Deo” e “conversio ad creaturam”, que se perfaz na escolha de um bem de forma incorreta. Em dizeres tenros, recebemos de Deus uma vontade livre, não impositiva, que nos é um imenso bem, contudo, o mal que praticamos é o mau uso dessa grande dádiva, que é o livre-arbítrio.

Sobre essa relação livre-arbítrio, mal e liberdade expressa no pensamento de Santo Agostinho em O livre-arbítrio, Etienee Gilson com grande acuidade descreve que: “Duas condições são exigidas para se fazer o bem: um dom de Deus que é a graça e o livre-arbítrio. Sem o livre-arbítrio (após o pecado original) não quereria o bem ou, se o quisesse, não conseguiria realizá-lo. A graça, portanto, não tem efeito de suprimir a vontade, mas de torná-la boa, pois ela se transformara em má. Esse poder de usar bem o livre-arbítrio, mas o poder de não fazê-lo é a marca da liberdade. A possibilidade de se fazer o mal, é o grau supremo da liberdade.” (GILSON, 1929, p. 202ss)

Portanto, o pensamento de Santo Agostinho sobre a liberdade perpassa gerações e mantêm-se me voga no que tange a reflexão sobre o mal e a implicância do livre-arbítrio em nossas condutas. Saber valorar cada atitude permite ao ser humano um maior aproveitamento de seus atos para o bem, mesmo que a inclinação para o mal esteja presente, num correto e vantajoso uso de nossa liberdade.

Autor: Fr. Bruno Coelho Gonçalves, SAC, estudante da turma do segundo ano do Curso de Filosofia da FASBAM.

Referências:

AGOSTINHO. A Cidade Deus. Trad. J.Dias Pereira. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2008, XXII,30.

GILSON, Etienne. Introduction à l’étude de saint Augustin. Libr. Philos. 2. ed. Vrin: Paris, 1929.

4 thoughts on “Santo Agostinho sobre a liberdade

  1. gustavo ferreira says:

    O ser humano não tem livre arbítrio. É em permanência constrangido pelo seu modo de ser e pelas suas circunstâncias externas e internas. Em cada momento da sua vida só tem capacidade, possibilidade de fazer o que faz. As suas circunstâncias internas são completamente determinadas por todas as experiências de vida.

  2. Jose Julio de Azevedo says:

    LIBERDADE

    A liberdade é o diferencial do verdadeiro ser humano. Quem nega a liberdade de alguem, de uma nação é porque já perdeu sua liberdade e a própria humanidade! Ser livre e perseverar em liberdade é dom de Deus aos seres humanos e que os pode manter vivendo “a imagem e semelhança” do seu Criador. Mas apenas Deus é infalível. Todo ser humano, por mais que busque não pecar, peca diariamente. Mas o socorro e o perdão são dádivas de Deus aos que, movidos pelo Seu Espirito, reconhecem seus erros, suas quedas, em busca do perdão. Perdão divino que nos encoraja, nos faz humildes e de grato coração. Nessa jornada caindo aprendemos a caminhar com Ele, que pacientemente nos levanta e encoraja. Sofremos as consequências do pecado, mas a redenção vem pela Graça manifesta no Calvário e vitoriosa na Ressurreição.

  3. Arthur Rafael Torres do Nascimento says:

    Valorosa a sua contribuição, FR. Bruno, ao dizer que “saber valorar cada atitude permite ao ser humano um maior aproveitamento de seus atos para o bem, mesmo que a inclinação para o mal esteja presente, num correto e vantajoso uso de nossa liberdade”. Obrigado pela reflexão.

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