Ao celebrarmos no Reino, na presença do Santo, estamos na Casa da Misericórdia. Deus é amor! Ele nos convoca para a celebração/concelebração sabendo quem nós somos, as nossas dores e quedas, as fraquezas, o nosso nada! Longe a maldade! Esta, sim, nos afasta de Deus! As nossas fraquezas aproximam, nos levam ao encontro com Aquele que nos conhece!
Quantas vezes repetimos a expressão: Senhor, atendei-nos (Господи, помилуй) durante a Divina Liturgia? Incluindo as ektenias pelos falecidos, Senhor, atendei-nos é uma oração repetida 53 vezes. Sinal de importância e grandeza! Dizer Господи, помилуй – Senhor, tende piedade – Senhor, atendei-nos, é pedir para que Deus se debruce sobre nós, pequenos, humildes, necessitados, assim como faz uma mãe diante de uma criança que sofre, chora ou pede algo. Ter misericórdia, é ter o coração voltado para a miséria, para a necessidade. E quantas necessidades nós trazemos diante de Deus! Pedimos pela paz, pela unidade da Igreja, pelo santo templo, pelos fieis, pela hierarquia da igreja, pelo país, governantes, pelos trabalhadores, por tempos favoráveis, pelas colheitas, por aqueles que estão em viagem, doentes, aflitos, prisioneiros, falecidos, por nós para que sejamos livres de todas as calamidades, perigos e privações. E tantas outras intenções, as nossas, particulares! Depositamos nas mãos do Senhor misericordioso todas as necessidades do mundo, da Igreja e nossas. Confiamos tudo na misericórdia divina. Após cada petição, respondemos: Senhor atendei-nos! Господи, помилуй! Como se disséssemos: Senhor, Tu nos conheces, és o nosso Pai, diante de ti está a nossa vida, nos guias pelos caminhos do mundo, conheces as nossas necessidades, confiamos na Tua Providência, olhai por nós, somos teus filhos amados! Quanta confiança na misericórdia divina! No decorrer da celebração, três vezes pedimos ao Senhor: Protegei-nos e ajudai-nos, tende piedade e salvai-nos, ó Deus, com a vossa graça! O que é que pode fugir do olhar do Senhor? O que pode nos faltar? Temos proteção, ajuda e salvação… tudo isso com a graça, com a força e o poder divinos.
Mas na celebração, a misericórdia divina também vem ao encontro da nossa indignidade e nos faz participantes. Ninguém é digno, reza o sacerdote na oração do canto Misticamente representando. Antes do canto Deus santo, Deus forte, Deus imortal… o sacerdote reza: “Permitistes a nós, humildes e indignos servos vossos, apresentar-nos neste momento diante do vosso altar para vos render glória e adoração… Aceitai, Senhor, dos lábios de nós, pecadores, o hino de proclamação da vossa santidade e volvei sobre nós o vosso misericordioso olhar. Perdoai todas as nossas faltas voluntárias e involuntárias, santificai as nossas almas e nossos corpos, e permiti-nos servir-vos na piedade em todos os dias da nossa vida…” É a misericórdia divina, o perdão dos pecados, que nos fazem dignos de estar diante da santidade e louvar o Santo. Sem a graça divina, sem a ação da misericórdia, não teríamos a veste nupcial, a dignidade, o coração puro… necessários para podermos participar do banquete no Reino. Na Sua misericórdia, o Senhor não somente nos torna dignos de estarmos na sua Casa, mas aceita os Dons por nós oferecidos. Em diversos momentos o sacerdote reza: Volvei Senhor o vosso bondoso olhar sobre esta comunidade… concedei a nós e a todos… as riquezas da vossa misericórdia e benevolência…. Nos concedestes a graça de estarmos juntos unindo as nossas vozes em oração… nos permitistes apresentar-nos agora diante do vosso altar e implorar a vossa compaixão por causa dos nossos pecados e pelas faltas do povo…Acolhei… e tornai-nos dignos de elevar preces e súplicas… tornai-nos capazes de invocar-vos… purifiquei as nossas almas e corpos… permitais comparecer diante do vosso altar… tornai-nos aptos, tornai-nos dignos… É a graça, a misericórdia que nos tornam aptos a estar presentes e participar.
Quanto carinho do Senhor misericordioso em nos guiar com a Sua Palavra! Deus nos quer seus, amigos, obedientes, filhos… por isso não nos abandona à mercê da sorte, do destino… mas nos guia com o Verbo eterno, que faz morada em nossos corações e torna-se Luz, lâmpada para os nossos passos.
Como entender o amor, a misericórdia divina que vem fazer morada em nossos pobres corações? Que faz unidade com a nossa pequenez, pobreza? Torna-se Pão, o melhor alimento? Que não leva em consideração a nossa frieza, indignidade, distrações… Deus entra na nossa história, conosco caminha, luta… torna-se a nossa força. É um Deus que volta-se para as nossas misérias e nos socorre em tudo o que necessitamos. É o amor que convive, comunga o nosso dia-a-dia.
Retornando para as nossas casas, somos convidados a viver a misericórdia para com os nossos irmãos, lavar os pés, servir como Ele serviu. Ser pão! Na Divina Liturgia fomos objetos do amor divino, agora é a nossa vez! Esta Divina Liturgia acabou, agora começa a nossa, a do dia-a-dia, lá fora, a do testemunho: amar como fomos amados.
Pe. Paulo Serbai, OSBM
Mestre em Ciências Eclesiásticas Orientais
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