Ser testemunha de Cristo na Igreja e no mundo: o testemunho de São Josafat

Reflexão de renovação espiritual do Pe. Teodoro Hanicz, OSBM para o mês de novembro.

“Que todos sejam um” (Jo 17, 21)

“Eu lhes dei tua palavra, mas o mundo os odiou, porque não são do mundo, como eu não sou do mundo. Não peço que os tires do mundo, mas que os guarde do Maligno. Eles não são do mundo como eu não sou do mundo”. (Jo 17, 14-16)

Somos convidados a viver a comunhão e a unidade. E isto se aproxima do ideal e da vida de São Josafat, cuja solenidade se celebra no dia 12 de novembro. Comunhão e unidade entre os cristãos foi a orientação da vida dele. São Josafat é uma figura luminosa para a Ordem Basiliana e para toda a Igreja.

Vamos iniciar a nossa reflexão com três perguntas:

  1. Quem é testemunha?
  2. Como ser testemunha de Cristo no mundo de hoje e na Igreja?
  3. Como São Josafat pode iluminar e fortalecer a nossa vida no testemunho de Cristo no mundo e na Igreja de hoje?

1. Quem é testemunha?

Testemunha é a pessoa que assistiu um acontecimento, que presenciou um fato. Pessoa que assiste um ato para atestar a sua veracidade, a sua validade. Então, testemunha é a pessoa que tem conhecimento de causa, e testemunhar é ter conhecimento de causa. Por exemplo, testemunhar um casamento, um acordo, um processo judicial, etc. Testemunhar a favor de alguém é tão comum no nosso cotidiano que, na maioria das vezes, não percebemos e tampouco damos a devida atenção. No meio popular é consagrada a forma de falar “ir de testemunha” quando se trata de testemunhar em favor de alguém.

2. Como ser testemunha de Cristo no mundo de hoje e na Igreja?

Se testemunhar é presenciar um fato e ter conhecimento de causa, então como testemunhar Cristo que não vimos, que não ouvimos sua voz e com quem não andamos? Nós não vimos o Jesus histórico.

Nosso testemunho de Cristo nos dias de hoje é pela fé na sua obra e na sua Palavra testemunhada e atestada pelos apóstolos, pelos evangelistas e pela primeira comunidade cristã. Os apóstolos conviveram com Jesus. O que eles viram e ouviram de Jesus, e depois proclamaram, continua verdadeiro até hoje.

Trago aqui algumas passagens dos evangelhos para ilustrar a insistência de Jesus no testemunho do discipulado. O evangelista Lucas narra que antes da ascensão, Jesus deu algumas instruções aos discípulos e depois disse: “Vós sereis testemunhas disso” (Lc 24, 48).

O apóstolo e evangelista João, no final do evangelho escreve: “Este é o discípulo que dá testemunho dessas coisas e foi quem escreveu e seu testemunho é verdadeiro” (Jo 21, 24).

O evangelista Marcos conclui o evangelho assim: “O Senhor Jesus, depois de lhes ter falado, foi arrebatado ao céu e sentou-se à direita do Pai. E os discípulos saíram a pregar por toda a parte, agindo com eles o Senhor, e confirmando a Palavra por meio dos sinais que a acompanhavam” (Mc 16, 19-20).

O evangelista Mateus narra as últimas palavras de Jesus aos discípulos antes da ascensão: “Ide, e fazei que todas as nações se tornem discípulos, batizando-as em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, e ensinando-as a observar tudo o que ensinei. E eis que eu estarei convosco até o fim dos tempos” (Mt 28, 20). “Fazei que todas as nações se tornem discípulos”, é o mesmo que dizer se tornem testemunhas. Então, por meio do testemunho dos primeiros discípulos, todos os batizados são testemunhas de Jesus. Testemunhar Jesus é a identidade do cristão, é a marca registrada, está “na genética” cristã. De maneira que hoje, nós, seguidores e discípulos, continuamos testemunhando as obras e as palavras de Jesus.

Importante prestar atenção na seguinte ideia. Os discípulos conviveram com Jesus por dois ou três anos, e só depois deram testemunho do que tinham visto e ouvido. Tinham visto os doentes serem curados, os coxos andarem, os cegos curados de sua cegueira, os mortos ressuscitados, os pecadores perdoados, aos pobres anunciando uma boa notícia.  Tinham ouvido Jesus falar do reino de Deus, do amor de Deus, de um Deus que é Pai, que é bondoso, amoroso, misericordioso, justo, que não condena, mas quer que seus filhos tenham vida em abundância. Era isso que os discípulos testemunhavam, anunciavam e ensinavam. Não anunciavam nem ensinavam doutrina nenhuma, teologia nenhuma, dogma nenhum, mas as obras de Jesus e a experiência que eles tiveram com ele, contavam a todo mundo. Sentiam que havia uma unidade profunda entre Jesus e o Pai. Cativava-os a maneira que Jesus falava dessa unidade e do amor misericordioso e infinito do Pai.

Testemunhar Jesus hoje é tarefa nossa, está em nossas mãos. Precisamos aprender com os discípulos e apóstolos que foram as primeiras testemunhas de Jesus. Se não temos conhecimento de causa, não podemos testemunhar. Testemunhar Jesus não se trata, em primeiro lugar, de anunciar e proclamar do púlpito ou da tribuna o evangelho, mas, antes de tudo, fazer a experiência da convivência, fazer a experiência da escuta e do aprendizado com o mestre Jesus, e depois, anunciar, proclamar as obras de Jesus feitas quando andava no mundo e também anunciar e proclamar as obras e as maravilhas que Deus opera em nosso favor hoje. Se a nossa vida cristã não está sendo testemunho, ela precisa ser remodelada. Falta alguma coisa, ou quem sabe, muita coisa.

Na maioria das vezes somos anunciadores de desgraças e de catástrofes. Somos pessimistas ao extremo. Vemos o mundo e a Igreja com tanto pessimismo que chega ser até assustador. Nessa lógica nem falar aqui das nossas conversas nesse tempo de pandemia. Falamos mau de tudo e de todos, dos defeitos, dos problemas das pessoas. Tudo e todos nos incomodam. A vida é um vale de lamentações. É um eterno queixume. Por que não falar das coisas boas que acontecem mesmo em meio às dificuldades e problemas? (Cuidado, não vamos confundir com gabolices). Esquecemos que o evangelho é alegria, é vida, e vida em abundância. Somos cristãos tristes, mal-humorados, de mal com a vida e com nós mesmos. Não somos testemunhas de qualidade. Nossa qualidade e testemunho, às vezes, são péssimos.

3. Como São Josafat pode fortalecer a nossa vida no testemunho de Cristo na Igreja e no mundo?

São Josafat não foi um grande teólogo, não escreveu livros, a não ser breves instruções de catequese ao povo e ao clero. Mas foi uma pessoa com uma vida inteiramente voltada ao testemunho de Cristo e do evangelho. Em São Josafat, cumpriram-se as palavras de Jesus que estão no evangelho de João: “Que todos seja um” e “Eu lhes dei tua palavra, mas o mundo os odiou, porque não são do mundo”. São Josafat, sentinela e arauto da unidade entre os cristãos e da união entre as Igrejas, foi odiado e perseguido, porque, com a vida anunciava a unidade e proclamava a verdade. E a verdade não faz parte deste mundo. Este mundo é o mundo da mentira, da injustiça, da opressão e da perseguição.

Dada a amplitude e a largueza do tema, brevemente, vou anotar aqui somente três características marcantes da vida de São Josafat e de seu pastoreio como monge basiliano, como sacerdote e como bispo. Essas três características são:

  1. Fidelidade a Cristo e a Igreja.
  2. Defesa da unidade cristã e da Igreja.
  3. Diálogo.

Em meio a um mundo conturbado pelas divisões entre os cristãos, incendiado pelo movimento de reforma do século XVI, São Josafat permaneceu fiel a Cristo e defendeu a unidade dos cristãos e da Igreja até o fim.

Como sacerdote e bispo, ele foi o bom pastor. Com amor e misericórdia acolheu a todos. Preferia o diálogo como um canal de entendimento entre as pessoas e nunca a imposição e a força. Nada de violência, nada de intolerância, mesmo sendo vítima da violência e da intolerância.  Sua humildade e seu jeito de falar e de ser, atraia as pessoas, a ponto de ser chamado pelos adversários de “ladrão de almas”. Por meio de sua vida e de seu testemunho fez ecoar a verdadeira força do evangelho, a força transformadora. Em meio a inúmeros conflitos, crises religiosas, crises de valores, decadência da Igreja, São Josafat, por meio do diálogo, da tolerância, da humildade, da compreensão, e sobretudo, por meio da oração, mostrou que era possível transformar a Igreja e a espiritualidade decadentes de seu tempo. São Josafat não quis outra Igreja Católica Ucraniana, mas quis a Igreja Católica Ucraniana transformada, convertida, transfigurada. Quis também uma Ordem Basiliana transformada, convertida, transfigurada. Quis que ambas, Ordem Basiliana e Igreja, fossem testemunhas de Cristo e sinais do Reino de Deus na sociedade e no mundo. Isso teve um alto preço. Custou-lhe a vida, custou-lhe o próprio sangue para que a Ordem Basiliana e a Igreja Católica Ucraniana tivessem vida espiritual e vida em Cristo. Por isso, São Josafat é exemplo de testemunho a ser seguido.

Que o martírio e o testemunho de São Josafat fecundem a nossa Igreja, fecundem a cada um de nós ao longo da nossa jornada missionária.

Que o martírio e o testemunho de São Josafat fortaleçam a missão da Ordem Basiliana, a missão da nossa Província de São José dos Padres e Irmãos Basilianos no Brasil, a missão da nossa Igreja.

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