A Solenidade da Exaltação da Santa Cruz | Série: Conheça o seu Rito

“Exaltamos, Cristo Vivificante, e honramos a vossa venerável Cruz, pela qual vós nos salvastes da escravidão dos inimigos”

(Hino de Louvor do Serviço das Matinas da Solenidade).

“A veneração da Santa Cruz do Senhor”, diz o venerável Andrey Sheptytskyy em sua carta pastoral sobre a Santa Cruz, “é um dos aspectos mais importantes de louvor do Deus-Homem… persignar-se com o sinal da Cruz é um dos costumes mais antigos dos cristãos”.

A Santa Cruz é um símbolo sempre vivo do amor eterno de Deus para nós pecadores, um símbolo do próprio sacrifício de Cristo, um símbolo de nossa redenção e salvação, um símbolo da vitória de Cristo sobre a morte e Satanás. Pela veneração da Santa Cruz, nós honramos o sacrifício, paixão e morte de Cristo. Sempre que nos persignamos com o sinal da Cruz, nós professamos a nossa fé em nosso Salvador.

A Igreja Oriental sustenta a veneração da Santa Cruz com tamanha consideração que dedica várias solenidades durante o ano em sua honra. A maior destas é a solenidades da “Elevação Universal da Venerável Vivificante Cruz”. Consideramos a história de sua instituição e os vários ritos a ela conectados.

História da Instituição da Solenidade

A solenidade da Elevação da Venerável Cruz é uma solenidade muito antiga. Contudo, como a história da descoberta da Santa Cruz do Senhor, a história da instituição da solenidade foi obscurecida por várias lendas e não é fácil separar fato histórico de lenda piedosa.

Devemos lembrar que ao celebrar esta solenidade, nós não estamos preocupados com a veneração comum da Santa Cruz, que ocorre no Terceiro Domingo da Grande Quaresma, mas com o aspecto da solenidade que se expressa no nome da própria solenidade – EXALTAÇÃO ou ELEVAÇÃO – da Cruz, que é, um rito solene especial conectado com a veneração e glorificação da Santa Cruz.

Historiadores da Igreja Oriental geralmente concordam que dois eventos particulares deram origem à instituição desta solenidade: a descoberta da Santa Cruz do Senhor no século IV e a recuperação ou retorno do cativeiro persa no século VII.

A instituição da Solenidade da Exaltação foi primeiramente precedida pelo encontro ou descoberta do sagrado madeiro da Cruz sobre o qual Cristo morreu. A tradição cristã nos transmitiu muitas lendas diferentes sobre a descoberta da Santa Cruz, sendo três das quais são atribuídas a Santa Helena (m. 330), a mão do imperador Constantino, o Grande. Acredita-se que a descoberta da Santa Cruz foi em 326.

Historiadores que mencionam a descoberta da Santa Cruz dizem nada sobre sua primeira exaltação imediatamente após seu encontro, e nem a tradição piedosa fala a respeito. A Igreja Grega celebra a descoberta da Santa Cruz no dia 6 de março. No Prólogo, esta solenidade da igreja tem o título: “A Descoberta da Venerável Cruz que foi encontrada pela Bem-Aventurada Helena”. A Igreja Latina celebra este acontecimento no dia 3 de maio, mas após a reforma dos dias festivos durante o papado de João XXIII, em 1960, esta festividade foi excluída do Calendário Eclesiástico.

A solenidade de Exaltação deve sua origem a consagração da Igreja da Ressurreição do Senhor, que foi erigida no Gólgota, em Jerusalém, pelo imperador Constantino, o Grande. Esta consagração foi solenemente celebrada durante a época de Macário, bispo de Jerusalém, no dia 13 de setembro de 335. Neste dia após a consagração, a solene exaltação ou elevação do madeiro sagrado da Cruz foi realizada. Durante sua elevação o povo exclamava: “Senhor, tende piedade” muitas vezes. Desde aquela época, a Igreja Oriental a cada ano celebrou a consagração da Igreja da Ressurreição do Senhor no dia 13 de setembro, e a solenidade da Exaltação da Venerável Cruz no dia 14 de setembro.

O segundo acontecimento importante, que tornou a solenidade universal no Oriente e no Ocidente, foi o retorno ou recuperação do sagrado madeiro da Cruz do cativeiro persa. O rei persa Cosroes em 614 conquistou Jerusalém e levou a Cruz do Senhor para o seu capitólio em Ctesifonte. Após 14 anos, o imperador Heráclio (610-641), após sua vitória sobre os persas, recuperou a Cruz sagrada e a trouxe de volta a Jerusalém, onde, no dia 14 de setembro, uma segunda celebração solene da exaltação da Santa Cruz foi realizada. Desde aquela época, a solenidade tem o nome “A Universal Exaltação (Elevação) da Venerável e Vivificante Cruz”. Uma vez que a solenidade da Exaltação lembrou a crucificação e morte de Cristo e recebeu o mesmo grau da Sexta-feira da Paixão, tornou-se um costume da Igreja, desde os tempos antigos, observar um estrito jejum neste dia.

A solenidade da Exaltação é uma das doze grandes solenidades de nossa Igreja e tem um dia de pré-solenidade e sete dias de pós-solenidade. O sábado e o domingo antes e depois da Exaltação, levam o nome de “O Sábado e o Domingo antes – ou depois da solenidade da Exaltação”, porque nestes dias a Epístola e o Evangelho falam da Santa Cruz.

Além da solenidade da Exaltação, a nossa Igreja presta honra à Sagrada Cruz no Domingo da Veneração da Santa Cruz. Neste dia, assim como na solenidade da Exaltação, a Santa Cruz é honrada e venerada durante o serviço das Matinas, mas sem o rito de exaltação, isto é, elevação, um rito em que é somente realizado na solenidade da Exaltação.

No dia 7 de maio a Igreja Oriental comemora a “Aparição do Sinal da Venerável Cruz no céu em Jerusalém”. No tempo de são Cirilo de Jerusalém, durante o tempo do Pentecostes no ano 351, a Santa Cruz apareceu no céu, estendendo-se do Gólgota até o Monte das Oliveiras.

No nosso Calendário Eclesiástico, nós ainda temos outra solenidade celebrada no dia 1 de agosto, a solenidade da “Procissão ou Marcha com o Sagrado Madeiro da Cruz”. Isto significa que havia uma procissão com uma peça do madeiro da Cruz que neste dia era levado do palácio real em Constantinopla à Igreja de Santa Sofia. Aqui, especial veneração era dada à Santa Cruz, similar a reverência prestada no Domingo da Veneração da Santa Cruz. A partir de primeiro de agosto, cada dia, durante duas semanas, o sagrado madeiro da Cruz era levado ao longo de toda a cidade enquanto Deus era clamado a abençoa-la e a preveni-la de todas as doenças. Esta solenidade foi instituída em Constantinopla no século IX devido a várias doenças e epidemias que normalmente ocorriam no mês de agosto.

O Rito de Exaltação e Elevação da Santa Cruz

Uma característica peculiar da solenidade da Exaltação é a solene e pública veneração da Santa Cruz por um rito separado de elevação durante o serviço das Matinas. Com o passar dos tempos, a Igreja Oriental desenvolveu vários ritos para a elevação da Santa Cruz. Aqui nós mencionaremos um pouco destes e os seus aspectos mais importantes.

  1. O Rito de Santo Atanásio no Monte Atos

Este rito é relembrando no Livro de Epístolas do século XI deste mosteiro. É muito simples. O patriarca em pé no ambão (no tempo em que os ambões ficavam no meio da igreja) elevava a Santa Cruz enquanto o povo cantava “Senhor, tende piedade”. Após os cinco tropários, nós lemos: “Salvai o Vosso povo, Senhor…”; “A Cruz Vivificante de Vossa bondade…” que é o tropário da pré-solenidade; “Assim que o madeiro de Vossa Cruz foi configurado…” – ambos os tropários são das sessionais no serviço das Matinas da solenidade; e o contáquio “Vós que voluntariamente subistes à cruz, Cristo-Deus…”.

  1. O Rito realizado no Monte Sinai

Este rito foi encontrado no Κανονάριον (Kanonarion) do Sinai do século X e foi realizado da seguinte maneira: no início, os tropários acima mencionados são considerados. Posteriormente, o arcebispo ascende ao ambão, toma a Santa Cruz, volta-se para o Oriente, persigna-se com ela três vezes e silenciosamente realiza a primeira elevação, levantando lentamente a Santa Cruz acima de sua cabeça a partir de seu peito. Enquanto ele está levantando a Santa Cruz, os fiéis cantam: “Senhor, tende piedade” cinquenta vezes, assim como cada vez que ele abaixa a Santa Cruz. Da mesma maneira, a segunda elevação é realizada voltada para o Sul, a terceira para o Ocidente, e a quarta para o Norte. Em cada elevação os fiéis cantam todos juntos cem vezes “Senhor, tende piedade”. Após a última elevação, uma prostração é feita diante da Santa Cruz enquanto o contáquio da solenidade “Vós que voluntariamente subistes à cruz, Cristo-Deus…” está sendo cantado.

  1. O Rito de Elevação em Constantinopla

Este rito é dado no Típico constantinopolitano do Mosteiro de Evergetes do século XII, e é similar ao rito do Sinai com a exceção de que, antes da elevação, apenas o tropário “Salvai, Senhor, o Vosso povo…” era cantado. O patriarca elevava a Santa Cruz não quatro, mas cinco vezes, que são para os quatro cantos do mundo, e a quinta vez novamente para o Oriente. Em cada elevação “Senhor, tende piedade” era cantado.

  1. O Rito de Elevação em nossa Terra Nativa, Rus’-Ucrânia

Este rito foi também mencionado no século XIII nos documentos de nossa Igreja. Nos tempos antigos, a elevação da Santa Cruz era realizada apenas nas catedrais onde havia um bispo e muitos sacerdotes. O Sínodo Patriarcal de 1276 permitiu este rito a ser realizado em todas as igrejas. O metropolita Cipriano (1381-1406) em suas Instruções para o clero da Rus, escreve: “quanto à elevação da Venerável Cruz, a Cruz é elevada para a glória da venerável e vivificante Crus” e, cada igreja ao longo da terra onde os cristãos vivem, mesmo que haja apenas um único sacerdote.

Nossos documentos dos séculos XV e XVI dão uma descrição do rito da exaltação ou elevação. A procissão da Santa Cruz durante a Grande Doxologia no serviço das Matinas e as petições da Tripla Ectenia durante a elevação – são iguais como hoje. Há cinco elevações em cada lado do tetrápode, e a última elevação era feita novamente para o Oriente. Durante cada elevação os fiéis cantam “Senhor, tende piedade” cem vezes. O rito termina com uma prostração e o beijo da Santa Cruz enquanto o contáquio “Vós que voluntariamente subistes à cruz, Cristo-Deus…” e o hino triplo “Adoramos a Vossa Cruz, Soberano, e glorificamos a Vossa santa Ressurreição” são cantados.

O Típico do Pe. I. Dolnytsky apresenta o rito de elevação de acordo com a tradição de nossa Igreja com apenas uma diferença – que na Galícia (Ucrânia Ocidental), em cada elevação da Santa Cruz, eles cantam “Senhor, tende piedade” não cem vezes, mas vinte e quatro vezes.

O serviço da solenidade da Exaltação ou Elevação da Venerável Cruz é, estritamente falando, um hino glorioso em honra da Cruz. Aqui a Santa Cruz é continuamente louvada e glorificada como o sinal de vitória, força e salvação: “Salve, Cruz vivificante”, exclama a estrofe posterior no serviço das Vésperas da solenidade, “invencível vitória da religião, portão do paraíso, fortaleza dos fiéis, proteção da Igreja. Por meio de vós, a corrupção é totalmente elevada da terra para os céus. Vós sois uma invencível arma, subjugadora de demônios, glória dos mártires, verdadeiro ornamento dos santos, o refúgio da salvação, – concedei ao mundo grande misericórdia”.

A solenidade da Exaltação, coloca a Santa Cruz diante dos nossos olhos, lembrando-nos de nossa obrigação de venerar, amar e confessar a Santa Cruz. “Não tenhais vergonha da Cruz de Cristo”, admoesta são Cirilo de Jerusalém em sua quarta catequese, “mesmo que alguns a escondam, no entanto, vós a traçais claramente em vossas testas para que os demônios, vendo o sinal real, possam tremer e para longe fugir. Façais esse sinal quando vós comerdes e beberdes, quando vós sentardes, deitardes, levantardes ou caminhardes, em síntese, em toda ocasião”.

São João Crisóstomo, em um sermão sobre o Cemitério e a Cruz, fala da importância da Cruz para nós: “a Cruz é um troféu contra os demônios, uma arma contra o pecado, uma espada com a qual Cristo trespassou a serpente. A Cruz é o desejo do Pai, a glória do Unigênito, alegria do Espírito, ornamento dos anjos, fortaleza da Igreja, a glória de Paulo, baluarte dos santos, a luz de todo o mundo”.

Fonte: KATRIY, Yulian Yakiv. Conheça o seu rito: o ano litúrgico da Igreja Greco-Católica Ucraniana. Roma: PP. Basiliani, 1982.

Pe. Yulian Yakiv Katriy, OSBM
(1912 - 2000) Doutor em Filosofia e autor de diversos livros.

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