O pecado do aborto e o pecado da contracepção | Série: A família cristã como nova criatura

Chamamos aborto o consciente e direto assassinato do ser humano no período entre a concepção e o nascimento, no próprio início de sua vida[1]. Comumente tais ações são realizadas em forma de interrupção artificial da gravidez. Abortos são também todos os atos ligados à manipulação que levam à destruição de embriões humanos, ocasionados como resultado da adoção de tecnologias de reprodução assistida.

A Sagrada Escritura destaca a dignidade da pessoa humana desde a concepção: “Antes mesmo de te formar no ventre materno, eu te conheci; antes que saísses do seio, eu te consagrei” (Jr 1, 5). A sacralidade e a inviolabilidade da vida humana fundamentam-se na atitude pessoal de Deus para com o homem.

São Basílio Magno diz: “A mulher que conscientemente mata o feto, submete-se à mesma pena que o assassinato. Não pertence a nós verificar se o feto já era formado ou ainda era amorfo; nesse caso, exige justiça não somente o ser que devia nascer, mas também aquela que lhe causou este mal, pois, como frequentemente acontece, as mulheres morrem em consequência desse procedimento. Somado ao assassinato do feto, este é um segundo assassinato, pelo menos por parte daqueles que ousarem cometer essa ação”[2].

O metropolita Andrey Scheptetskei, na carta “Não matarás”, enfatiza: “Particularmente hediondos, terríveis e antinaturais são os casos em que os pais matam seus próprios filhos. Muito piores são eles, quando esses filhos ainda não vieram ao mundo. A própria circunstância quando o delito é cometido pelo próprio pai ou pela mãe, quando a criança não pode defender-se… tudo isso torna o aborto uma categoria especial de crime”[3].

A vida humana é confiada, desde a concepção, à mãe e ao pai, que dela devem cuidar e defendê-la. Mas, às vezes circunstâncias dramáticas (estupro, coação por parte da família, etc.) ou motivações egoístas podem obrigar a mulher a destruir a vida que ela carrega dentro de si. Isso não elimina a sua responsabilidade; mas, junto com ela, outras pessoas tornam-se responsáveis pelo aborto. Culpado é o pai da criança que coage a mãe a praticar o aborto ou a abandona durante a gravidez. Corresponsáveis no pecado do aborto são também os parentes ou amigos que eventualmente “obrigam” a mulher a fazer o aborto, justificando o ato pela conservação do bom nome ou pretextos semelhantes. E, por fim, grande e derradeira culpa recai sobre os médicos e outros agentes de saúde, que praticam diretamente o aborto. Incidem em culpa também aqueles que no meio social defendem e propagam o aborto.

O pecado da contracepção

Chamamos de contracepção os atos intencionais, pelos quais o homem inibe a fertilidade da esfera procriativa e impede a concepção de nova vida humana. Ações contraceptivas influem na pessoa inteira, limitando a sua disponibilidade para acolher o dom de uma nova vida. Consequências desses atos podem ser a incapacidade não só fisiológica, mas também espiritual, moral e psicológica do casal para a geração de filhos, a formação de uma mentalidade contraceptiva.

Nenhum meio contraceptivo garante totalmente a não concepção. Nas famílias, onde o casal é fisiologicamente fecundo, mas pela prática da contracepção é incapaz de acolher uma nova vida, são concebidos “filhos indesejados”; surge a “gravidez indesejada” que leva ao nascimento de “filhos indesejados” ou até ao aborto. Por isso a mentalidade contraceptiva conduz, em final de contas, à mentalidade abortiva. A contracepção, em vez de diminuir o número de abortos – como argumentam os que são a seu favor – apenas estimula uma vida sexual desregrada e, pelo contrário, conduz a um aumento ulterior do número de abortos.

A contracepção é frequentemente indício de uma crise já latente nas relações familiares e destrói a unidade do matrimônio cristão. Na maioria das vezes, a decisão de usar meios anticoncepcionais está relacionada com o temor de gravidez e com a recusa da procriação. Se os cuidados com o filho pesam somente sobre um dos cônjuges, recusar a concepção é comumente uma espécie de “protesto” contra esse isolamento no matrimônio. As ações contraceptivas são um mal moral, porque se contrapõem à vocação do matrimônio para a paternidade e a maternidade.

A contracepção não só impede a fusão das células sexuais masculina e feminina, mas destrói a possibilidade dos esposos de cooperar com o Criador em aceitar e trazer ao mundo uma nova vida. Tal matrimônio rejeita o plano de Deus em relação a ele, reduz a vida familiar a “assunto privado”, desdenhando a verdade de que somente Deus é o Senhor do princípio e do fim da vida humana.

O uso da contracepção perverte a essência natural do ato sexual, arruina não só a sua natureza procriativa, mas também o seu sentido de união entre os cônjuges. A contracepção conduz a uma convivência desresponsabilizante, cujo objetivo é unicamente o prazer individual. Isso causa grave dano ao autêntico fundamento da convivência conjugal: ao amor oblativo, pelo qual os esposos se doam e se aceitam mutuamente em plenitude, e particularmente doam um ao outro a sua fecundidade.

Os meios anticonceptivos hormonais têm dupla ação: a contraceptiva e a abortiva, por isso são imorais. Esses meios impedem os processos fisiológicos normais no organismo da mulher e causam sua infertilidade. Apesar disso, esses meios nem sempre impedem a concepção de um filho. A ação seguinte da contracepção hormonal encaminha-se para impedir o desenvolvimento ulterior do embrião no útero materno e a causar a sua morte nos primeiros estádios de desenvolvimento. Por isso a Igreja, defendendo a vida de toda a pessoa desde o momento da concepção, contrapõe-se ao uso dos meios contraceptivos. A única exceção pode ser a adoção de ativos hormonais, que podem ter efeitos contraceptivos, com objetivos de tratamento médico e somente para um determinado prazo, prescrito pelo médico.

O metropolita Andrey aponta um mal especial causado pela contracepção: “Semelhantes ao assassinato de crianças, ainda que sejam pecados de outro gênero, são os atos pelos quais os pais limitam o número de filhos. Tais casos não são evidentemente pecados de assassinato, mas é difícil não considerá-los como grave ofensa […], pois mesmo que não se tenha tolhido a vida, foi impedido o acesso à vida! Um povo, no qual as mulheres não querem aceitar […] o ônus da maternidade, no qual os homens buscam o prazer sexual sem assumir as obrigações e os deveres da vida matrimonial, sem levar em conta os fins do matrimônio, esse povo é condenado à ruína”[4].

[1] Cf. João Paulo II: Encíclica Evangelium vitae (“Evangelho da vida”), (25 de março de 1995), 58.

[2] Basílio Magno: Carta 188, cânon II.

[3] Metropolita Andrey: Não matarás, (21 de novembro de 1942).

[4] Metropolita Andrey: Não matarás (21 de novembro de 1942).

Fonte: Cristo nossa Páscoa: Catecismo da Igreja Greco-Católica Ucraniana. Tradução: Pe. Soter Schiller, OSBM. Curitiba: Serzegraf, 2014, n. 880-891.

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