A Solenidade da Apresentação de Nosso Senhor, Jesus Cristo, no Templo | Série: Conheça o seu Rito

“Alegrai-vos, Virgem Mãe de Deus, cheia de graça, pois de Vós resplandeceu o Sol da justiça, o Cristo-Deus nosso, que ilumina aos que estão nas trevas…”

(Tropário da Solenidade).

O Ciclo Natalino se conclui com a solenidade da Apresentação de Nosso Senhor no dia 2 de fevereiro, o quadragésimo dia após a Natividade de Cristo. Esta solenidade é extremamente conectada com a Natividade de nosso Senhor, pois assim como a divindade de Cristo foi revelada em sua Natividade de nosso Senhor, pois assim como a divindade de Cristo foi revelada em sua Natividade, assim é também manifestada em sua apresentação no Templo. Do encontro do Menino Divino e sua Santíssima Mãe com o justo Simeão, a solenidade, na Igreja Oriental, recebe o nome de “O Encontro”. Aqui nós consideramos a origem da solenidade, sua instituição e o espírito de seu serviço.

O Fundamento da Solenidade

A solenidade da Apresentação ou do Encontro é fundamentada no evento da vida de nosso Salvador, recordado no Evangelho de são Lucas[1]. A lei de Moisés prescrevia que cada mulher que desse à luz a um menino fosse excluída do Templo por 40 dias, pois durante este tempo ela era considerada como impura. Estes 40 dias eram chamados de “dias de purificação”. Quando este período de purificação terminava, a mãe do recém-nascido ia ao Templo e oferecia um cordeiro de um ano de idade como uma oferenda, e um pombo ou rola, enquanto uma mulher pobre tinha que ofertar um par de pombos ou rolas. A Puríssima Virgem Maria, sendo a Mãe de Deus, não era obrigada a se submeter a este rito de purificação, pois ela foi santificada pelo nascimento de Cristo, assim como o contáquio destaca: “com a Vossa Natividade santificastes o ventre da Virgem…”. Mesmo assim, em sua humildade, ela cumpriu a prescrição da lei e ofereceu como um sacrifício duas pombas.

Em adição a isto, outro rito foi realizado sobre o primeiro filho homem no quadragésimo dia – o rito de o oferecer a Deus e a sua redenção subsequente. Ele que era para santificar e redimir toda a humanidade, desejou que Ele, o próprio, primeiro fosse consagrado a Deus e então redimisse: “o Deus eterno”, diz a estrofe das Vésperas Solenes, “que deu a antiga lei a Moisés no Sinai, aparece neste dia como um infante. O Criador da lei cumpre a Lei. Ele é levado para o templo e entregue ao ancião”.

Aqui, o encontro providencial do Menino Divino e a sua Puríssima Mãe com o justo Simeão, merece atenção especial. São Lucas relata que Simeão “era justo e piedoso; ele esperava a consolação de Israel e o Espírito Santo estava nele. Fora-lhe revelado pelo Espírito Santo que não veria a morte antes de ver o Cristo do Senhor”. Pela inspiração divina, Simeão reconhece o Menino Jesus como Messias. Ele o toma em seus braços e com uma bela oração bendiz ao Senhor Deus pela graça de ver como seus próprios olhos o Redentor Prometido. Nossa Igreja sempre conclui o serviço das Vésperas com a oração de Simeão: “Agora, Senhor, podeis deixar…”. Entretanto, o velho Simeão prediz à Santíssima Mãe de Deus o seu futuro sacrifício e sofrimento por causa de Jesus Cristo.

A Instituição da Solenidade

A solenidade da Apresentação ou do Encontro se originou em Jerusalém na segunda metade do século IV. A sua primeira menção é feita pela peregrina Sílvia Egéria em seu Diário, onde ela a chama de “o quadragésimo dia após a Epifania”. Ela descreve a celebração deste dia nas seguintes palavras: “o quadragésimo dia após a Epifania é certamente celebrado aqui com a maior solenidade. Neste dia há uma procissão até a Anastasis[2], onde todos se reúnem para a Divina Liturgia; todas as coisas são realizadas de maneira prescrita com a maior solenidade, assim como no Domingo de Páscoa. Todos os padres proferem sermões, assim como também faz o bispo; todos pregam sobre o texto do Evangelho descrevendo como no quadragésimo dia, José e Maria levam o Senhor para o templo, e como Simeão e Ana, a profetisa, filha de Fanuel, viu-o, e quais palavras eles falaram ao ver o Senhor, e a oferta que seus pais levaram”[3].

De Jerusalém, a solenidade se espalhou por todo o Oriente, mas apenas no século VI sob o imperador Justiniano ordenou que a solenidade da Apresentação ou do Encontro fosse considerada como uma grande solenidade e celebrada em todo o Império. Por esta razão, no serviço desta solenidade a Igreja reza diversas vezes pelo imperador.

Os motivos para a solene celebração da solenidade da Apresentação foram dois extraordinários eventos: uma peste em Constantinopla e seus arredores, e um terremoto em Antioquia. Ao final do ano 541, uma peste, da qual milhares de pessoas morreram diariamente, atingiu Constantinopla e seus distritos vizinhos. Esta peste durou por três meses. Em adição a isso, um grande terremoto ocorreu em Antioquia. A Tradição relata que, naquele tempo, um determinado homem santo recebeu uma revelação de Deus que o desastre que aconteceu sobre a nação cessaria quando a solene celebração da Apresentação do Senhor fosse instituída. O imperador ordenou que a solenidade da Apresentação fosse solenemente observada e a peste cessou.

Do Oriente, a solenidade da Apresentação passou a Roma no século V, e de lá se espalhou para a França e Espanha no século VII, e então para a Alemanha no século VIII. Alguns atribuem sua instituição no Ocidente ao papa Gelásio (m. 496), enquanto outros atribuem ao papa Gregório Magno (m. 604). Acredita-se que o  Sérgio (687-701) tenha introduzido o costume de realizar uma procissão com velas nesta solenidade, um costume que rapidamente se espalhou de Roma a Jerusalém e outras cidades da Palestina. Cirilo de Citópolis (m. 557) na Vida de São Teodósio Magno relata que uma rica esposa de um oficial romano, chamada Icalia, construiu uma bela igreja entre Jerusalém e Belém em honra da Santíssima Mãe de Deus, onde introduziu o costume de celebrar a solenidade da Apresentação com velas. O patriarca de Jerusalém, Sofrônio (m. c. 641), fala deste costume também em seu sermão sobre a solenidade da Apresentação. A luz das velas é um belo símbolo da verdadeira luz de Deus – nosso Senhor, Jesus Cristo.

Carregar velas na procissão da solenidade da Apresentação parece ter sido realizada primeiramente em Alexandria. Em seu sermão sobre a apresentação do Menino Jesus ao templo, Cirilo de Alexandria (m. 444) menciona a procissão luminosa neste dia. Teodóto de Ancira (m. 446) fala deste mesmo costume sendo praticado em Ancira. Abençoar velas nesta solenidade da Apresentação se tornou um costume apenas após o século X. A primeira menção dela é feita no Missal Romano do século XII.

No Ocidente, a solenidade da Apresentação originalmente era considerada como uma solenidade de nosso Senhor; apenas muito tempo depois ela foi reconhecida como uma solenidade Mariana designada como: “A Purificação da Puríssima Virgem Maria” ou “A Apresentação de Jesus no Templo”. As mais recentes prescrições da Igreja Latina, promulgadas no Concílio Vaticano II, novamente colocaram a solenidade da Apresentação entre as solenidades do Senhor, designada como “A Apresentação de Jesus no Templo”.

Na Igreja Oriental, a solenidade da Apresentação é celebrada como uma solenidade Mariana e algumas vezes é chamada de “O Encontro da Santíssima Mãe de Deus”. Esta solenidade tem um dia de pré-solenidade e sete dias de pós-solenidade. Muitos Padres e Doutores da Igreja Oriental têm sermões para esta solenidade, e santo André de Creta, são João Damasceno, são Cosme de Jerusalém, patriarca Germano I e José, o Hinógrafo; contribuíram para a liturgia desta solenidade. A igreja soleniza a memória de Simeão, o Justo e Ana no dia seguinte a solenidade da Apresentação.

O Espírito do Serviço da Solenidade

O Espírito do serviço solene é o mesmo como o da Natividade de nosso Senhor e da Teofania: glorificar a Teofania (manifestação de Deus) na terra, exaltar a Divindade de Cristo e dar honra à Puríssima Virgem Maria como a Mãe de Deus. São Cirilo de Alexandria fala belamente do conteúdo profundo e da importância desta solenidade em seu sermão para este dia: “o Eterno”, ele diz, “é tanto uma pequena Criança como o ‘Ancião de Dias’ (isto é, Deus). O Menino no peito e ao mesmo tempo o Criador das Eras. Eu contemplo um Menino e reconheço Deus. O Menino é nutrida e ao mesmo tempo sustenta o universo. O Menino chora e ao mesmo tempo dá vida e alegria ao mundo. O Menino esta envolta em faixas e ao mesmo tempo Ele me liberta das amarras do pecado… Este Menino – os anjos O glorificam, os arcanjos se prostram diante dEle. Os Principados temem em Sua presença, as Potestades O louvam, os querubins O reverenciam, os serafins O bendizem, o sol O louva, a lua O serve, a natureza O obedece, as fontes e os mares se submetem a Ele… Este Menino dominou a morte, superou o mal, aboliu a maldição de Adão… lavou todos os pecados, condenou todas as heresias, adornou toda a criação, salvou Adão, renovou Eva, convocou todas as nações e santificou o universo… Portanto, vamos todos saudar a Apresentação de nosso Senhor com esplendor… Assim sendo, vamos iluminar este dia com velas, como convém aos filhos da luz, e vamos trazer a Cristo a Luz da iluminação espiritual”.

As estrofes das Vésperas, os hinos sessionais, o cânon e as estrofes do serviço das Matinas formam um magnífico hino de glória em honra da Teofania de Cristo (manifestação) celebrando a Encarnação da Eterna Palavra de Deus, e exaltando a Santíssima Mãe de Deus. O pequeno menino, levado ao templo por seus pais, é o Deus Eterno que deu a lei a Moisés no Monte Sinai: “Aquele que uma vez deu a Lei a Moisés no Sinai”, nós cantamos nas estrofes das Vésperas Solenes, “hoje se submete à prescrição da Lei, em sua compaixão, Ele se tornou como nós para o nosso bem… Hoje Simeão o toma em seus braços o Senhor da glória, a Quem Moisés uma vez viu na escuridão, quando sobre o Sinai, Deus lhe deu as tábuas… O Criador dos céus e da terra hoje é levado nos braços do velho Simeão”.

O Menino que nós vemos hoje no templo é o Messias enviado por Deus e predito pelos profetas: “Simeão, conte-nos sobre quem você alegremente leva para o templo. Para quem vós estais dizendo: agora, Senhor, podeis deixar o Vosso servo ir em paz, segundo a Vossa palavra. Porque os meus olhos viram o meu Salvador. Ele é o menino nascido da Virgem. Ele é a Palavra, Deus de Deus! Senhor, que por nossa causa se encarnou e salvou a humanidade, a Vós nos prostramos em adoração”.

E a Mãe do Menino que O levou para o templo é a Santíssima Mãe de Deus: “adornai vossa câmara nupcial, Sião e recebei Cristo, o Rei”, dizem as estrofes posteriores no serviço das Vésperas, “acolhei Maria, a porta dos céus, pois ela apareceu como um trono querubínico em que o Rei da Glória está sentado”. A Puríssima Virgem maria não é somente a Mãe de Deus, mas também nossa esperança e nossa Medianeira. Na nona ode do cânon das Matinas, nós lhe suplicamos: “Virgem Mãe de Deus, Esperança dos Cristão, protegei, cuidai, e guardai todos aqueles que colocam a esperança em vós… Virgem Mãe de Deus, auxílio do mundo, protegei-nos e preservai-nos de toda preocupação e inquietude”.

A santa Igreja, vendo o grande mistério da Teofania e o amor de Deus sobre nós, invoca os fiéis a darem glória a Cristo, o Senhor: “que o coro dos anjos se surpreenda com essa maravilha, e nós, homens mortais, vamos levantar nossas vozes no canto, contemplando a inefável condescendência de Deus. Os velhos braços hoje O abraçam diante de Quem os poderes dos céus tremem, o único que ama a humanidade[4].

[1] Lc 2,22-40.

[2] Igreja da Ressurreição para os orientais ou Basílica do Santo Sepulcro.

[3] SÍLVIA EGÉRIA. Diário. 26.

[4] Hino sessional das Matinas.

Fonte: KATRIY, Yulian Yakiv. Conheça o seu rito: o ano litúrgico da Igreja Greco-Católica Ucraniana. Roma: PP. Basiliani, 1982.

Pe. Yulian Yakiv Katriy, OSBM
(1912 - 2000) Doutor em Filosofia e autor de diversos livros.

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