A Solene Bênção da Água | Série: Conheça o seu Rito

“Vinde, então, Rei e Amigo dos homens e santificai esta água através do envio do Espírito Santo”

(Rito da Solene Bênção da Água).

Estritamente ligada com a solenidade da Teofania é a Solene Bênção da Água ou Bênção da Água do Jordão. Esta sagrada tradição da Igreja Oriental permite voltar aos primeiros séculos do cristianismo. No decorrer do tempo, diferentes ritos se desenvolveram para a Solene Bênção da Água nas solenidades da Teofania. Desde os tempos mais antigos, nosso povo tem muito carinho pelo costume da Solene Bênção da Água. As pessoas imbuíram uma grande importância da Solene Bênção da Água que elas mantêm em seus lares como algo que possui grandes poderes santificadores. Aqui nós consideraremos a história da Solene Bênção da Água, seus ritos, e sua santidade.

História da Solene Bênção da Água

A Igreja Oriental distingue entre uma pequena e uma grande bênção de água. A pequena bênção de água acontece no dia 1º de agosto, na intersolenidade do Pentecostes, na solenidade do santo padroeiro, e em outras ocasiões. Na Grécia existe o costume de santificar a água usando uma pequena bênção a cada mês.

A Solene Bênção da Água é realizada suas vezes ao ano: na vigília e na solenidade da Teofania. Nos primeiros séculos, o solene batismo dos catecúmenos era realizado na véspera das grandes solenidades, como a Páscoa, o Envio do Espírito Santo ou a Teofania. A bênção da água era associada como rito do batismo. Alguns historiadores são da opinião de que a Solene Bênção da Água na véspera da solenidade da Teofania não tinha a intenção de comemorar o batismo de Cristo, mas era apenas destina para o batismo dos catecúmenos. Isto é evidente na primeira oração da Solene Bênção da Água que é quase idêntica à oração da bênção da água no batismo.

Os primeiros quatro séculos não nos dão uma informação clara a respeito do tempo em que a Solene Bênção da Água tomou o seu lugar. Em seu Sermão sobre a Solenidade da Teofania, são João Crisóstomo fala de uma bênção de água à meia-noite, “pois neste dia”, diz ele, “Cristo foi batizado e santificou a natureza da água”. Então, desde o século V, a bênção da água acontece geralmente na Véspera da Teofania. Os historiadores Jorge Cedreno (séc. XII) e Teodoro, o Leitor, atestam que o patriarca Pedro, contemporâneo do imperador Zenão (474-491), foi o primeiro a introduzir o costume de abençoar a água durante a noite da Véspera da Teofania. Tiago de Edessa (séc. V) seguia o mesmo caminho.

No primeiro milênio da Igreja Oriental, apenas uma Solene Bênção da Água acontecia e esta ocorria na Véspera da solenidade. Os antigos típicos gregos e fontes falam de uma única bênção da água. O Típico grego da Biblioteca do Sinai datado do século XII prescreve a bênção a água somente na Véspera da solenidade da Teofania. A respeito da solenidade, ele estabelece: “Após as Matinas, não há uma segunda bênção da água”. O Típico da Biblioteca Patriarcal de Jerusalém do século XIV nota: “Vós também deveis conhecer que o Típico da Grande Igreja (isto é, de Constantinopla) uma bênção da água é prescrita, nomeadamente, na Véspera da solenidade. Os Típicos do mosteiro Estudita e de Jerusalém prescrevem uma bênção da água, pois Cristo foi batizado apenas uma vez, não duas”.

O costume de abençoar de abençoar a água em duas datas do século XI: na Véspera e no dia da solenidade. Este costume de uma bênção dupla se tornou uma lei geral no século XIII. O Típico da biblioteca veneziana do ano 1387 prescreveu duas bênçãos da água: na Véspera e no dia da solenidade após a Grande Doxologia. O típico de santo André de Skete no Monte Atos, do século XV, fala de uma Solene Bênção da Água na Véspera após a Oração do Ambão e na solenidade, após o serviço das Matinas. A razão para a bênção dupla da água era que a água abençoada na Véspera da solenidade era considerada como um símbolo da prática de batizar os catecúmenos, enquanto que a bênção da água no dia da solenidade era realizada em memória do batismo de Cristo no Rio Jordão. Consequentemente, a primeira bênção da água, como uma regra, ocorria no adro da igreja, onde no passado os catecúmenos eram batizados, enquanto que a bênção da água no dia da solenidade ocorria fora da igreja, em rios, fontes ou poços. O Sínodo de Lviv (1891) orientou que o rito da bênção da água fosse realizado tanto na Véspera como na Solenidade da Teofania.

Os Ritos da Solene Bênção da Água

As cerimônias da Solene Bênção da Água levaram centenas de anos para se desenvolverem. Nós não sabemos a forma do rito original da Solene Bênção da Água. Tiago de Edessa testemunha que a oração “Grande sois Vós, Senhor…” veio de são Proclo, patriarca de Constantinopla (434-446); a estrofe “A voz do Senhor implora sobre as águas” e a oração “Trindade, transcendente em essência…” de Sofrônio, patriarca de Jerusalém (c. m. 641). Da Solene Bênção da Água, o Eucológio Barberini dos séculos XVIII-XIX tem somente a Grande Ectenia que é diferente da que utilizamos no presente, e três orações. O Típico da Grande Igreja dos séculos IX-X nota que, após o fim da Liturgia, os cantores cantavam o tropário “A voz do Senhor” e enquanto ele era cantado, todos iam ao batistério no nártex (ou adro) da Igreja. Aqui o diácono cantava a ectenia e o patriarca lia a oração para a santificação da água e abençoava a água; três leituras seguiam, e com o canto do tropário o rito da bênção da água era concluído.

Desde o século XIII, o rito da Bênção da Água se tornou um pouco como o nosso, e nos séculos XIV e XVI, o rito da Solene Bênção da Água assumiu sua presente forma.

Por volta de 1148 a Crônica Ipatiana menciona a Solene Bênção da Água na Ucrânia, e a chama de Vodokhryschi (voda = água; khrystyty = batizar) ou Água Batismal, isto é, o batismo de água. Originalmente, ele era realizado em nossa Igreja somente na vigília da Solenidade da Teofania. Apenas depois que a nossa Igreja, no século XIV, começou a usar o típico de Jerusalém, ao invés do Típico estudita, ela adotou as duas bênçãos de água. Máximo, o Grego (m. 1556), defende o novo costume de acordo com a bênção da água realizada no dia da própria solenidade em um rio ou uma fonte. O liturgikon do metropolita Cipriano (m. 1406) já tinha o atual rito da Solene Bênção da Água.

Em tempo, desenvolveram-se em nossa Igreja Ucraniana certos ritos conectados com a Solene Bênção da Água que os típicos gregos ou outros típicos eslavos não têm. Os típicos gregos falam somente de uma tripla submersão cruciforme da cruz na água ao fim da Bênção da Água. O rito russo da Solene Bênção da Água tem, além disso, uma tripla bênção com a mão. O Eucológio do metropolita Pedro Mohyla do ano 1646, prescreve que depois da primeira oração a água fosse abençoada três vezes cruciformemente, isto é, fazendo o sinal da cruz na água com o candelabro acesso; após a segunda oração – que fosse três vezes cruciformemente (isto é, cada vez que o sacerdote soprar sobre a água, ele faz o sinal da cruz com sua cabeça) e após a terceira oração – deve-se abençoar com a mão submergida na água. De acordo com o costume atual, nós usamos para abençoar não um, mas três candelabros triplos acesos que nós submergimos na água três vezes. O rito da Solene Bênção da Água termina com uma tripla bênção cruciforme da água com a cruz, submergindo-a na água, enquanto o tropário: “Senhor quando fostes batizado no Jordão…” é cantado. Após a Bênção da Água, o sacerdote asperge o povo com a água santificada. Nosso povo tem um belo costume de erigir uma cruz de gelo no rio onde a bênção da água é realizada.

A Água Santificada – Um Objeto Muito Sagrado

Desde os tempos antigos a Igreja Oriental tem considerado a água santificada como um grande sacramental, possuindo poderes milagrosos para cura tanto da alma como do corpo. Em um sermão sobre a Solenidade da Teofania, são João Crisóstomo diz: “Este é o dia no qual Cristo foi batizado e abençoou a natureza da água. Por esta razão, à meia-noite desta solenidade, os fieis levam a água para seus lares e a mantém ao longo de todo ano. É interessante notar que esta água abençoada não se estraga por um longo tempo, ela permanece fresca até mesmo por dois ou três anos, e após um longo período a sua qualidade não difere da água recentemente levada do poço”. A Igreja Grega chama a água santificada de mega hagiasma que significa algo muito sagrado.

Na Antiguidade prevalecia o costume na Igreja daqueles que não estavam aptos a receber a Sagrada Comunhão por uma razão ou por outra, receber a Água Santificada com grande devoção que eles observavam um estrito jejum na época de sua bênção e a recebiam em jejum, assim como eles faziam com a Sagrada Comunhão. Nosso povo aspergia todos os seus imóveis e toda a propriedade com esta água para espantar qualquer espírito impuro de suas terras. Até mesmo hoje nos países para os quais os ucranianos imigraram, eles alegremente recebem o sacerdote que abençoa e santifica suas casas com a Água Santificada.

O conteúdo das orações e ritos da Solene Bênção da Água melhor refletem a fé de nossa Igreja Oriental no poder e bênção da água santificada. Nestas orações, nós repetidamente clamamos que o Espírito Santo venha sobre a água para purificá-la e santificá-la, e transmitir para ela um poder de cura par ao bem da alma e do corpo. A Grande Ectenia na bênção da água tem nada mais que 26 petições, entre as quais nós encontramos a seguinte: “Para que esta água possa ser santificada pelo poder, operação e envio do Espírito Santo”, “para que desça sobre estas águas a ação purificadora da consubstancial Trindade”, “que esta água possa ser dotada com a graça da redenção, a bênção do Jordão, pelo poder e ação e envio do Espírito Santo”, “que nós sejamos iluminados pela luz do entendimento e da piedade através do envio do Espírito Santo”, “que ela possa servir como uma purificação das almas e corpos daqueles que, com fé, a recebem e participam dela”, “que ela seja um dom de santificação, libertação do pecado, cura da alma e do corpo, e para todos os outros benefícios”.

As mais belas e profundas orações da Solene Bênção da Água exaltam a Santíssima Trindade e rogam ao Espírito Santo para que desça e santifique a água. Aqui a importância, poder, e santidade da Solene Bênção da Água é enfatizada. O seguinte exemplo pode nos ajudar a entender a importância destas orações: “Hoje as águas do Rio Jordão são modificadas em cura pela vinda do Senhor. Hoje os pecados da humanidade são levados pelas águas do Jordão. Hoje o paraíso se abriu para a humanidade e o Sol da justiça brilha sobre nós… Hoje nós somos libertados da antiga lamentação e como um novo Israel, nós somos salvos. Hoje nós somos libertados da escuridão e iluminados com a luz do conhecimento de Deus… Hoje toda criação é iluminada… Por isso, Rei e Amigo dos homens, vinde e santificai esta água através do envio de vosso Espírito Santo. E conferi sobre ela a graça da redenção, e a bênção do Jordão. Fazei dela uma fonte de incorruptibilidade, um dom de santificação, remissão dos pecados, cura de doenças, destruidor de demônios, tornai-a inacessível aos poderes adversos, e fazei-a repleta do poder dos anjos, para que todos aqueles que recebem e participam dela possam ser abençoados em suas almas e corpos, curados dos seus sofrimentos, santificados em seus lares, e eles possam receber cada graça condizente… Concedei santificação, bênção, purificação e saúde para todos aqueles que a tocam, que aspergem a si mesmos com ela ou participam dela”.

Fonte: KATRIY, Yulian Yakiv. Conheça o seu rito: o ano litúrgico da Igreja Greco-Católica Ucraniana. Roma: PP. Basiliani, 1982.

Pe. Yulian Yakiv Katriy, OSBM
(1912 - 2000) Doutor em Filosofia e autor de diversos livros.

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