“Olhai, Cristo, sobre o sofrimento do meu coração, olhai sobre a minha conversão e minhas lágrimas, Salvador, e não rejeitai-me!”.

(Ode 9 do Cânon das Matinas do Filho Pródigo)

Para nos preparar para o Grande Jejum, a santa Igreja indica na parábola do Fariseu e do Publicano que o primeiro passo para conversão é a humildade. Neste domingo, ela nos coloca o exemplo do Filho Pródigo para nos mostrar como alguém se converte para Deus. Onde há humildade e arrependimento de coração, há a porta da misericórdia de Deus aberta.

Exegetas chamam a parábola do Filho Pródigo de pérola das parábolas. Ela é única por seu profundo conteúdo moral. Sua história dramática está sendo constantemente repetida nas almas de milhões em todo o mundo. O Filho Pródigo é o símbolo de cada alma pecadora. Esta parábola claramente demonstra que nada na terra pode satisfazer nossa fome mordaz e sede de felicidade. A verdadeira felicidade e paz são para serem encontradas somente em Deus, nosso Pai amado. Alguns expoentes da vida espiritual também chamam esta parábola de parábola do amor de Deus.

Qualquer um que se afasta de Deus pelo pecado e procura felicidade fora de Deus, mais cedo ou mais tarde, será forçado a dizer com o Filho Pródigo: “vou-me embora, procurar o meu pai.” e com Santo Agostinho que foi um filho pródigo por muitos anos: “nosso coração anda inquieto, Deus, até repousar em ti”.

Destaques da Parábola

 A parábola do Filho Pródigo é conhecida para todos nós. Nós ouvimos seu relato várias vezes em nossa infância, em nossas aulas de religião e nós a ouvimos todo ano na igreja, assim sendo, nós não precisamos analisá-la em detalhes. Nós devemos direcionar nossa atenção somente para os seus aspectos mais importantes.

Na parábola, Jesus Cristo escolhe a vida de uma família rica como seu tema. O mais jovem de dois filhos deseja deixar a casa de seu pai para desfrutar liberdade absoluta, para viver uma vida de acordo com os desejos do seu coração. E então, tomando a parte da herança que era sua, ele viajou para um país distante.

De acordo com a lei judaica o primogênito ou o filho mais velho recebia dois terços da propriedade familiar, enquanto o restante era dividido entre os outros filhos. Na parábola havia apenas dois irmãos; consequentemente, o mais novo recebeu um terço da propriedade.

Os seus primeiros dias de completa independência longe do lar de sua família foram bons e alegres. Liberdade ilimitada, um bolso cheio de dinheiro, muitos amigos que estavam sempre presentes onde havia dinheiro, a diversão contínua fez com que ele se tornasse intoxicado pelo prazer. Mal ele começou a desfrutar a desfrutar essa liberdade ilimitada quando seus pertences, seus amigos e festas começaram a derreter como a neve de primavera, e logo ele foi reduzido a extrema pobreza. Além disso tudo, uma fome devastou o país, e ele foi forçado a se tornar um cuidador de porcos. Entre os judeus, cuidar de porcos era um sinal de absoluta degradação porque os judeus consideravam os porcos ritualmente como animais impuros. Portanto, o jovem homem rico que desejou viver de acordo com os desejos de seu coração se tornou um desprezível cuidador de porcos.

Refletindo sobre sua miséria e fome, ele decidiu retornar para a casa do seu pai. Ele estava preparado a se tornar um servo de seu pai. Contudo, quando seu pai o viu enquanto ele ainda estava muito longe, ele se emocionou com pena. Ele correu até o menino, tomou-o em seus braços e o beijou. Ele restaurou para seu filho sua dignidade como filho, presenteando-o com uma túnica festiva, um anel e sandálias.

No Oriente, presentear um homem com uma túnica festiva era um sinal de honra especial. O anel com o selo era o símbolo de autoridade, usado pelos reis e altos funcionários. A Bíblia relata que quando o Faraó fez José governador do Egito, “tirou o anel de sua mão e o colocou na mão de José, e o revestiu com vestes de linho fino e lhe pôs no pescoço o colar de ouro”[1]. As sandálias eram usadas pelos ricos enquanto os pobres e os escravos ficavam descalços.

O Filho Pródigo – Símbolo da Misericórdia para o Pecador

A parábola do Filho Pródigo tem um profundo significado simbólico. Quando nós a ponderamos, nós espontaneamente percebemos que o Filho Pródigo não é ninguém menos que cada pessoa que, por meio de uma vida pecadora, se afastou de Deus. Por esta razão, a parábola é muito real para nós; ela é a história de nossas vidas. É um símbolo de nossa infidelidade com Deus. Mas é também um símbolo da misericórdia infinita de Deus para conosco. Hoje, como o mundo está cheio de filhos e filhas pródigos, está parábola é dramatizada por inúmeros milhões. Cada pessoa é aquele filho mais velho que é fiel ao seu pai ou aquele filho mais jovem que somente por meio de uma difícil e penosa se torna convencido que fora da casa paterna não existe felicidade.

A parábola nos ensina que Deus perdoa e misericordiosamente até mesmo os maiores pecadores, se eles se arrependem e se lamentam por seus pecados. A história do gênero humano é nada menos que a história da misericórdia de Deus. “Mas o amor do Senhor!… existe desde sempre e para sempre existirá por aqueles que o temem”[2].

O Espírito do Serviço do Domingo do Filho Pródigo

 Todo o serviço deste domingo retrata em um estilo bem poético a história do filho desobediente, a imensa saudade da alma pecadora por Deus, sua miséria e sofrimento sobre a sua queda, sua sincera contrição e arrependimento, e o amor misericordioso do Pai celeste. Até mesmo as melodias deste dia expressam o choro de uma alma arrependida.

A santa Igreja, com o objetivo de nos lembrar que nós somos todos exilados nessa terra e estamos bem longe da nossa casa celeste, prescreve nesse dia que nós cantemos o mais belo e hino de saudade e falta da casa paterna conhecida na história. Este é o hino que os israelitas cantavam na prisão da Babilônia. Este hino nostálgico é o Salmo 137. No serviço das Matinas deste domingo, os versículos seguintes deste salmo são cantados:

“À beira dos canais de Babilônia nos sentamos, e choramos com saudades de Sião. Nossos raptores queriam alegria: ‘Cantai-nos um canto de Sião!’ Como poderíamos cantar um canto do Senhor numa terra estrangeira? Devastadora filha de Babel, feliz quem devolver a vós o mal que nos fizestes! Feliz quem agarrar e esmagar vossos nenês contra a rocha!”[3].

Este Salmo tem sua melodia característica. Cada versículo deste Salmo termina com o canto prolongado e emocionante do “Aleluia” que é repetido três vezes. Este Salmo é também cantado nos Domingos da Dispensa da Carne e dos Laticínios.

Além da saudade por Deus, nasce dentro do coração do pecador o mesmo arrependimento sobre seu estado pecaminoso que o Filho Pródigo vivenciou. Na primeira estrofe das Vésperas Solenes do Domingo do Filho Pródigo, nós cantamos:

“Eu viajei para uma terra de animais e pecado, semeei o pecado e o colhi com a foice da preguiça; e com as minhas mãos eu juntei meus atos em feixes, mas não os coloquei na trilha do arrependimento. Mas eu vos imploro, Divino Esposo, separeis o joio das minhas ações com a brisa de vosso amor compassivo; e preenchei minha alma com o trigo do perdão. Armazenai-me em vossos celeiros celestiais, e salvai-me.”

A consciência da própria miséria induz a um sincero e profundo arrependimento, assim como um desejo de implorar a Deus por perdão e misericórdia. Esses sentimentos são expressos no seguinte tropário:

“Apressai para me abrir vossos braços paternos, pois amei de maneira irreconhecível a minha vida; mas já que Vós sois infinitamente rico em misericórdia, Salvador, não desprezais meu coração empobrecido, pois a Vós, Senhor, eu exclamo em arrependimento: eu pequei, Pai, diante dos céus e diante de Vós”.

E onde há arrependimento pelo pecado e lá encontraremos a misericórdia sempre generosa de Deus para a qual segue a seguinte estrofe de louvor das Vésperas Solenes:

“Vamos, irmãos e irmãs, aprender o significado desse mistério: quando o Filho Pródigo renunciou sua vida pecadora e retornou para a casa do seu pai, o bom pai correu para o encontrar, beijou-o, e novamente restaurou a sua glória. E ele preparou um banquete abatendo o novilho cevado, que é um mistério para os habitantes dos céus, para que possamos dignamente morar com o Pai, Amigo dos Homens, que abateu o novilho, e com o Sacrifício – o Salvador de nossas almas”.

[1] Gn 41,42.

[2] Sl 103,17.

[3] Sl. 137.

Fonte: KATRIY, OSBM, Yulian Yakiv. Conheça o seu rito: o ano litúrgico da Igreja Greco-Católica Ucraniana. Trad. Marco Antônio Pensak, OSBM. Curitiba: Faculdade São Basílio Magno, 2021.