O consumo midiático e o excesso do tempo em tela no século XXI

Em um dia normal, quanta mídia você consome? Quais são as mensagens que estão sendo enviadas para você? Como elas influenciam seu pensamento ou mesmo suas decisões?

A alfabetização midiática não é realmente um fenômeno novo. Começando com a invenção da prensa de impressão no século XV, a mídia se desenvolveu como uma forma de comunicação além do interpessoal. Jornais e revistas eram uma força da mídia na Era Industrial.

Os contínuos avanços na tecnologia nos expõem a mais e mais mídias. O uso da tecnologia e da alfabetização digital andam de mãos dadas. A tecnologia permite uma maior expansão dos meios de comunicação de massa, começando pela Internet, mas também devemos considerar o Facebook, Twitter, Instagram e a lista continua… Existem diferentes propósitos para a comunicação de massa, incluindo informar, divertir, persuadir e esclarecer.

O século XXI trouxe consigo uma verdadeira revolução no consumo midiático. Nunca antes na história da humanidade estivemos tão conectados, tão expostos a uma infinidade de informações e estímulos. A internet, com suas redes sociais e plataformas de streaming, tornou-se onipresente, moldando comportamentos, influenciando decisões e alterando a forma como interagimos com o mundo ao nosso redor. O fenômeno do excesso de consumo midiático, aliado ao tempo em tela, levanta questões filosóficas profundas sobre a natureza dessa nova realidade e suas implicações para a sociedade contemporânea.

O filósofo alemão Martin Heidegger, em sua obra “Ser e Tempo”, explorou a questão da técnica e da alienação do ser humano. Heidegger argumentava que a técnica, embora trouxesse avanços e facilidades, também tinha o potencial de distanciar o ser humano de sua essência, transformando-o em um mero “recipiente” de informações. Aplicando essa perspectiva ao contexto atual, podemos questionar se o excesso de consumo midiático está nos afastando de nossa essência, tornando-nos passivos diante da avalanche de informações que recebemos diariamente.

Por outro lado, o filósofo francês Michel Foucault, com suas análises sobre poder e conhecimento, poderia nos ajudar a entender como as mídias modernas atuam como mecanismos de controle. Foucault sugeria que o poder não está centralizado em uma instituição específica, mas disperso por toda a sociedade, presente em discursos e práticas cotidianas. Nesse sentido, as mídias digitais e o constante fluxo de informações podem ser vistos como formas sutis de exercer poder, moldando nossas percepções e comportamentos de maneira quase imperceptível.

O excesso de tempo em tela também levanta questões sobre a qualidade das interações humanas. A filósofa Hannah Arendt, em sua obra “A Condição Humana”, discutiu a importância da ação e do discurso como formas de revelar a singularidade humana. Arendt enfatizava a importância da presença física e do engajamento direto entre as pessoas para a construção de uma esfera pública vibrante e significativa. A predominância das interações virtuais, mediadas por telas, pode estar comprometendo a profundidade e a autenticidade dessas interações, levando a uma alienação social e emocional.

Por outro lado, não podemos ignorar os benefícios trazidos pelo avanço tecnológico e pelo acesso quase ilimitado à informação. O filósofo canadense Marshall McLuhan, conhecido por sua frase “o meio é a mensagem”, destacava que cada novo meio de comunicação não apenas transmite informações, mas também altera a estrutura da sociedade e a forma como pensamos. A internet e as mídias digitais democratizaram o acesso ao conhecimento, possibilitando que pessoas de diferentes partes do mundo compartilhem ideias, aprendam novas habilidades e se engajem em causas sociais de maneira inédita.

Contudo, a reflexão filosófica sobre o consumo midiático excessivo e o tempo em tela nos obriga a considerar a qualidade da informação consumida. A era digital, embora rica em conteúdo, também é marcada pela proliferação de fake news, desinformação e bolhas de filtro que reforçam preconceitos e polarizações. O filósofo alemão Jürgen Habermas, com sua teoria da ação comunicativa, enfatizava a importância do discurso racional e da deliberação pública para a construção de uma sociedade democrática. A superficialidade das interações online e a velocidade com que as informações são disseminadas podem estar comprometendo a capacidade de engajamento crítico e reflexivo da população.

Portanto, a resposta à questão se o excesso de consumo midiático e o tempo em tela são bons ou ruins não é simples. É uma questão que envolve uma análise cuidadosa dos impactos positivos e negativos dessa nova realidade. A tecnologia, ao mesmo tempo que nos conecta e nos empodera, também nos desafia a encontrar um equilíbrio saudável, onde o consumo de mídia não comprometa nossa essência, nossas relações humanas e nossa capacidade de reflexão crítica.

Em última análise, cabe a cada indivíduo e à sociedade como um todo refletir sobre o papel que a mídia e a tecnologia desempenham em nossas vidas. Devemos buscar maneiras de utilizar essas ferramentas de forma consciente e equilibrada, aproveitando seus benefícios sem nos deixarmos consumir por elas. Afinal, a verdadeira alfabetização midiática não reside apenas na capacidade de consumir informação, mas na habilidade de discernir, questionar e utilizar essa informação de maneira que enriqueça nossas vidas e fortaleça nossa humanidade.

Por Ana Beatriz Dias Pinto, professora de Comunicação na FASBAM.

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